Extraído do site : http://www.radardaprimeirainfancia.org.br/prontidao-escolar-um-resultado-desenvolvimento-na-primeira-infancia/
Historicamente, as opiniões sobre prontidão
escolar tem recebido níveis diferentes
de prioridade na preparação escolar e social da criança. O artigo a seguir
resume as evidências sobre a transição escolar e a prontidão escolar com o
objetivo de apresentar definições dos pesquisadores sobre prontidão escolar,
características da prontidão infantil, e prontidão como resultado de
experiências na primeira infância.
Evidências
sugerem que a prontidão escolar é um fator importante para prever o sucesso
escolar da criança, e que as caracterizações da prontidão escolar são
multidimensionais. A autora aponta que os programas elaborados para preparar a
criança para a pré-escola devem considerar formas de ensinar habilidades sociais e de autorregulação, e
devem melhorar sua capacidade cognitiva.
Transição escolar e prontidão escolar: um resultado do
desenvolvimento na primeira infância
Sara
Rimm-Kaufman, PhD.
University
of Virginia, EUA
Fevereiro
2004 (Inglês).
Tradução: fevereiro 2012
Introdução
Pesquisas recentes redefiniram
o que significa para uma criança “estar pronta” para a pré-escola. O objetivo principal das Metas 2000, estabelecidas pelo Painel
Nacional de Metas para Educação,1 foi
“garantir que todas as crianças ingressem no ensino fundamental prontas para
aprender.” Historicamente, as opiniões sobre prontidão escolar tem
recebido níveis diferentes de prioridade na preparação escolar e social
da criança.
Do que se trata
Pesquisadores já analisam o tema da transição escolar e
prontidão escolar há várias décadas. As
questões recorrentes são: o que significa estar pronto para o ensino
fundamental? De que forma os diversos estudiosos podem priorizar os
diferentes aspectos da prontidão escolar? Quais são os antecedentes da
prontidão escolar? Este breve relatório resume as evidências sobre a
transição escolar e a prontidão escolar com o objetivo de apresentar definições
dos pesquisadores sobre prontidão escolar, características da prontidão
infantil, e prontidão como resultado de experiências na primeira infância.
Problemas
Crianças e suas famílias vivenciam uma grande descontinuidade na
transição para a pré-escola. Essa mudança é perceptível, embora mais de 80% das
crianças norte-americanas já tenham recebido cuidados de forma regular de um
cuidador que não era da família antes dessa transição.2 A mudança nas prioridades e o maior
rigor escolar apresentam desafios para a criança ao iniciar sua educação
formal.
O atual ambiente educacional nos EUA acentuou a sensação de
descontinuidade para as crianças neste país. A ênfase na responsabilização
forçou um “currículo concentrado”, segundo o qual se espera que a criança
apresente níveis mais altos de desempenho escolar desde a mais tenra idade. A
transição para a pré-escola tornou-se uma questão cada vez mais visível, à
medida que o governo federal e governos estaduais consideram os méritos de
programas de educação infantil financiados com recursos federais. Além disso, as crianças que ingressam na
pré-escola são diferentes daquelas da geração anterior: são provenientes de
backgrounds cada vez mais diversificados em relação à raça, etnia, condições
econômicas e de linguagem.3
Prontidão escolar leva ao
sucesso escolar. Pesquisas sugerem que os resultados escolares da criança,
principalmente seu desempenho escolar, permanecem notavelmente estáveis após os
primeiros anos de escolarização.4,5 Além
disso, há evidências de que as intervenções têm maior probabilidade de sucesso
quando implementadas nos primeiros anos de escolarização.6 Como consequência dessas evidências,
pesquisadores, formuladores de políticas educacionais, educadores e pais
tentam resolver o que significa para a criança estar “pronta” para
ingressar no ensino fundamental.
Contexto de pesquisa
Atualmente, inúmeros estudos de larga escala consideram o sucesso
da transição para o ensino fundamental como uma variável-chave: Head Start Transition Study(Estudo de Transição do
Head Start),7National
Education Longitudinal Study (Estudo
Longitudinal de Educação Nacional),8,9NICHD Study for Early Child Care (Estudo sobre Cuidados na Primeira
Infância do Instituto Nacional de Saúde da Criança e Desenvolvimento Humano, do
NICHD (National Institute of Child Health and Human Development),10 e National Center for Early Development and
Learning (Centro
Nacional para Desenvolvimento e Aprendizagem Precoces).11,12
Os três principais conjuntos de trabalhos documentados na
literatura especializada apresentam discussões sobre prontidão escolar. O
primeiro é baseado em pesquisas de larga escala que analisam as opiniões dos
interessados envolvidos – por exemplo, professores de educação infantil e pais
– sobre sua percepção de prontidão
escolar. O segundo conjunto de pesquisas analisa definições de prontidão
escolar, levando em consideração a importância relativa de habilidades
cognitivas, habilidades sociais e de autorregulação, e idade cronológica. O
terceiro analisa a prontidão escolar e o desempenho escolar da criança nos
primeiros anos de escolarização como uma função de experiências educacionais
iniciais e de processos sociais vinculados às famílias.
Questões-chave de pesquisa
As questões-chave de pesquisa incluem: como professores e pais definem prontidão? Quais são os marcadores
cognitivos, sociais, autorregulatórios e cronológicos da prontidão escolar? Que
contextos no lar e em instituições de educação infantil estão associados à
prontidão escolar?
Resultados de pesquisa
O que é prontidão: definições
apresentadas por professores e pais
Estudos analisaram a definição de prontidão formulada por
diferentes estudiosos envolvidos nos processos de transição da pré-escola. Uma
pesquisa nacional com professores de pré-escola realizada pelo National
Center for Educational Statistics(Centro Nacional para Estatísticas
Educacionais) mostrou que os professores identificaram a criança “pronta” como
aquela que é fisicamente saudável, bem tranquila e adequadamente alimentada;
que é capaz de comunicar verbalmente suas necessidades, seus desejos e seus
pensamentos; e que mostra curiosidade e entusiasmo ao abordar novas atividades.
Surpreendentemente,
os professores não deram importância a habilidades específicas relacionadas a
operações com números e linguagem. Por outro lado, os pais normalmente definem
prontidão em termos de capacidade escolar – como saber contar ou conhecer o
alfabeto.13 Um estudo realizado pelo National Center for Early Development
and Learning (Centro Nacional de Desenvolvimento e de Aprendizagem Precoces)
avalia a prontidão por meio da análise do julgamento dos professores em relação
à transição escolar da criança para o ensino fundamental (EF), e revela que
quase 50% das crianças que ingressam nesse nível tiveram alguma dificuldade na
transição para a pré-escola. O problema
citado com mais frequência pelos professores de pré-escola foi a dificuldade de
seguir instruções.14
Prontidão escolar definida
segundo marcadores cognitivos, sociais, autorregulatórios e cronológicos
A pesquisa sobre prontidão escolar está centrada nas relações
entre marcadores cognitivos, sociais,
autorregulatórios e cronológicos da prontidão. Foi demonstrado que os
primeiros sinais de capacidade e maturidade cognitiva estão associados ao
desempenho da criança no ensino fundamental, e por esse motivo essa abordagem
altamente intuitiva para avaliar a prontidão é utilizada como indicativo de que
a criança está preparada para o ambiente escolar.15 O trabalho meta-analítico realizado
por La Paro e Pianta16 mostra
que a avaliação cognitiva na educação infantil prediz, em média, 25% da
variância das avaliações cognitivas das séries iniciais da escolarização
(pré-escola, primeira ou segunda série do ensino fundamental), dando suporte à
importância de indicadores cognitivos, mas sugerindo também que outros fatores
explicam a maior parte da variância nos resultados escolares iniciais.
Outra pesquisa indica o
vínculo entre as habilidades sociais da criança relacionadas com a aprendizagem
e o desempenho escolar, por exemplo, em que foi demonstrado que a adaptação
social da criança na pré-escola está relacionada com seu desempenho e seu
envolvimento durante essa etapa da educação infantil,17,18e suas habilidades relacionadas ao trabalho – por exemplo, o nível de
cumprimento de instruções – estão relacionadas com o sucesso no ensino
fundamental.19
Pesquisas indicam também a importância da autorregulação como
preditor de prontidão escolar. Blair20 propõe uma
definição neurobiológica de prontidão escolar, e sugere que habilidades autorregulatórias fornecem a base para muitos
comportamentos e capacidades necessários na pré-escola. Em conjunto, as capacidades para prestar
atenção de forma seletiva, mostrar reações sociais adequadas e manter
envolvimento em tarefas escolares são consideradas como fatores que contribuem
para a “prontidão escolar” e para sua definição.
A idade da criança também é um marcador da prontidão escolar,
uma vez que indica maturidade em termos cognitivos, sociais e
autorregulatórios. As pesquisas sobre o efeito da idade levam a diferentes
conclusões. Por exemplo, alguns estudos
sugerem que, embora haja algumas vantagens para crianças um pouco mais velhas
no momento da transição para a pré-escola, esses efeitos desaparecem por volta
da terceira série do ensino fundamental.21,22
Quais são os antecedentes da
“prontidão”?
Pesquisas demonstram que os
atributos do ambiente de educação infantil frequentado pela criança contribuem
diretamente para sua transição para o ensino fundamental e sua adaptação a esse
nível educacional. Programas de educação infantil ou de cuidados na primeira infância de
qualidade predizem facilidade de adaptação na pré-escola,23 melhoram as competências
pré-escolares, fortalecem habilidades sociais e autorregulatórias24 e reduzem a probabilidade de
resultados negativos, como repetência.25 Melhor formação de cuidadores e baixa
relação crianças/equipe também são fatores associados com competência cognitiva
anterior ao ingresso no ensino fundamental.26 Esses efeitos parecem ser ainda mais
pronunciados em meio a crianças expostas a condições de alto risco.27 Evidências mais recentes apontam para
respostas proporcionais: crianças que passaram mais tempo em contextos de
cuidados não maternos mostram maiores conflitos e mais problemas de
externalização na pré-escola.10
Os processos familiares também influenciam as competências da
criança ao ingressar no ensino fundamental. A qualidade dos relacionamentos entre pais e filhos,
especificamente a sensibilidade e a estimulação parentais, tem uma correlação
clara e frequentemente documentada com o sucesso escolar inicial.28-32A conduta dos pais em relação a seus filhos e à estimulação, os materiais
e as rotinas que oferecem no ambiente de casa são aspectos-chave dos fatores
familiares que têm efeitos substanciais sobre a adaptação da criança nos
primeiros meses e anos do ensino fundamental.33,34
Conclusão
Evidências sugerem que a
prontidão escolar é um fator importante para prever o sucesso escolar da
criança, e que as caracterizações da prontidão escolar são multidimensionais. Professores e pais têm definições diferentes de prontidão escolar – os professores enfatizam a prontidão em
aspectos sociais, ao passo que os pais enfatizam a prontidão escolar. Pesquisas sobre qual
dessas definições está mais estreitamente associada ao sucesso escolar apontam
para a estabilidade moderada de indicadores cognitivos de prontidão escolar,
assim como a importância das capacidades da criança em outras áreas.
Revelam que capacidades sociais e de autorregulação fornecem os fundamentos
para o sucesso escolar e que, considerada isoladamente, a idade cronológica não é um
indicador eficaz de prontidão escolar. Preditores iniciais de sucesso escolar indicam a contribuição de
relacionamentos positivos com colegas e processos familiares sensíveis e
estimulantes, e, em alguns aspectos, a qualidade do ambiente de cuidados
infantis.
Implicações
Essas constatações têm implicações para a formulação de
políticas e práticas educacionais. Os
programas elaborados para preparar a criança para a pré-escola devem considerar
formas de ensinar habilidades sociais e de autorregulação, e devem melhorar sua
capacidade cognitiva.35 Com
frequência, a expansão do desenvolvimento de habilidades sociais requer uma
abordagem mais sensível, em termos contextuais, à facilitação da transição para
o ensino fundamental, na qual pais e professores devem ver a si mesmos como
colaboradores fundamentais para a adaptação social e escolar.11
Para os profissionais, é fundamental ter consciência das
múltiplas dimensões da prontidão escolar. Uma vez que pais e professores têm
diferentes definições para a prontidão escolar, são necessárias práticas de
transição para ajudar as famílias e as escolas a chegar a um acordo sobre a
idade adequada para o ingresso no ensino fundamental, e a desenvolver
expectativas coerentes para o período da pré-escola. Tendo em vista a grande
diversidade das escolas nos Estados Unidos e o maior rigor escolar nas séries
iniciais do ensino fundamental, recursos adicionais alocados a essas práticas
de transição podem beneficiar as crianças, principalmente aquelas em situação
de risco quanto a dificuldades escolares no início da nova etapa educativa.
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