Superdotação, Asperger (TEA) e Dupla Excepcionalidade por Claudia Hakim

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sexta-feira, 16 de agosto de 2013

Contribuições do WISC-III para a compreensão do perfil cognitivo de crianças com altas habilidades



Texto de autoria de :
Izabel Hazin ; Síntria Labres Lautert ;  Jorge Tarcísio da Rocha Falcão ; Danielle Garcia ; Ediana Gomes ;   Mariana Borges 


I Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, Brasil
II Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Brasil



A contribuição da Escala Wechsler de Inteligência para Crianças (WISC-III), não com o objetivo único de encontrar escores de QI que quantifiquem e, portanto, embasem a atribuição do diagnóstico de altas habilidades, mas sobretudo na compreensão do perfil cognitivo de crianças com altas habilidades no domínio intelectivo. Tal ferramenta de avaliação deve ser considerada instrumento auxiliar apto, por seu rigor e pressupostos teóricos de construção (Primi, 2003), a contribuir para o avanço na compreensão acerca do funcionamento interdependente das funções psicológicas superiores neste subgrupo específico. A escolha por esta escala é justificada pela anuência em relação à concepção de inteligência proposta por seu autor, David Wechsler, para quem a inteligência é mais um efeito do que uma causa, podendo ser descrita como um conjunto de componentes intelectivos e não-intelectivos que permitem ao sujeito agir intencionalmente, pensar e lidar com o seu ambiente (Nascimento & Figueiredo, 2002).


A Escala Wechsler de Inteligência para Crianças (WISC-III), padronizada para a população brasileira por Vera Lúcia Marques de Figueiredo e publicada em 2002 (Cruz, 2005), é composta por 12 subtestes, distribuídos em dois grupos: verbal e de execução. Os escores brutos obtidos nos subtestes são transformados em escores ponderados que juntos fornecem o QI total (QIT), o QI verbal (QIV), no caso dos subtestes verbais e o QI de execução (QIE), no caso dos subtestes não-verbais, além de quatro Índices Fatoriais: Compreensão Verbal (ICV), Organização Perceptual (IOP), Resistência à Distração (IRD) e Velocidade de Processamento (IVP). 

O WISC-III tem sido largamente utilizado por psicólogos e neuropsicólogos no âmbito da avaliação de grupos especiais (Fiorello, Hale, McGrath, Ryan, & Quinn, 2002; Simões, 2002). Estudos realizados com crianças diagnosticadas com transtorno do déficit de atenção/hiperatividade (TDA/H), autismo de alto e baixo funcionamento e altas habilidades têm demonstrado que nestes subgrupos os desempenhos encontrados nos Índices Velocidade de Processamento (IVP) e Resistência à Distração (IRD) são mais baixos que os dos Índices Organização Perceptual (IOP) e Compreensão Verbal (ICV), com destaque para o subteste Código onde são encontradas as pontuações mais baixas (Calhoun & Mayes, 2005; Mayes & Calhoun, 2007; Naglieri, Goldstein, Iseman, & Schwebach, 2003).


Conclusões


A utilização do WISCIII na identificação e compreensão do funcionamento intelectivo de crianças com altas habilidades tem gerado certa polêmica, notadamente em torno de dois aspectos centrais, a saber, a discrepância entre os escores encontrados para o QI verbal (QIV) e o QI de execução (QIE) na população de crianças com altas habilidades (Sweetland, Reina, & Tatti, 2006; Legree, Pifer & Grafton, 1996) e a ênfase do WISC-III na dimensão da velocidade de processamento das respostas (Fishikin & Kampsnider, 2000; Winner, 2000; Kaufman, 1992) que poderia estar subjacente à discrepância supracitada.


Tais discrepâncias podem ser igualmente problematizadas a partir das proposições de Winner (2000), para quem alguns mitos acerca das altas habilidades, foram historicamente construídos, dentre os quais se destacam dois, diretamente relacionados com o estudo ora apresentado, a saber: (i) a crença segundo a qual crianças com altas habilidades no domínio intelectual apresentam um desenvolvimento homogêneo de todas as funções cognitivas; (ii) a expectativa de que a capacidade intelectual e o desempenho escolar/acadêmico sejam fortemente correlacionadas.


Nesta direção, estudos desenvolvidos com crianças com altas habilidades mostraram que a superioridade em determinadas habilidades pode conviver com o déficit e que comumente tais crianças apresentam assincronias no seu desenvolvimento que não se referem apenas à distância entre a capacidade intelectual e a idade, mas igualmente a assincronias entre os domínios da linguagem e da visoespacialidade (Colangelo; Kerr; Chrstnsen & Maxey, 1993; Winner & Casey, 1993) ou do raciocínio lógico-matemático quando comparado ao desenvolvimento psicomotor (Silverman, 2007; Pérez, 2004) o que levou Geschwind e Galaburda (1987) a cunharem o termo "patologia da superioridade". 


Condizente com tais reflexões, pesquisas desenvolvidas com crianças com altas habilidades discutem que tal subgrupo pode vir a apresentar dificuldades de aprendizagem como conseqüência de déficits atencionais, de funcionamento executivo, de linguagem e/ou de memória (Silverman, 2007; Rech & Freitas, 2005; Webb & Dietrich, 2005). Entretanto, crianças com altas habilidades mobilizam mecanismos que mascaram tais déficits, tornando os mesmos imperceptíveis no contexto de uma investigação generalista (Robinson, Zigler & Galagher, 2000). Tais aspectos refletem as dificuldades envolvidas na identificação da criança com altas habilidades e conseqüentemente vêm exigir esforços em termos de problematização, discussão e aprofundamento das técnicas e instrumentos utilizados para circunscrever o fenômeno das altas habilidades.


Os déficits acima referidos podem igualmente ter relação com escolhas de crianças com altas habilidades intelectivas por atividades sócio-culturais que ressaltam os pontos fortes deste subgrupo, assim como o afastamento destes dos esportes e da dança, o que contribui para as dificuldades de socialização vivenciadas por estas crianças.


Salienta-se por fim que o presente estudo demonstrou que o WISC-III é um instrumento a ser utilizado não apenas na busca do cômputo de QIs e Índices Fatoriais, mas essencialmente é uma ferramenta que contribui para a compreensão do funcionamento cognitivo de subgrupos específicos, destacando pontos fortes, mas também fornecendo pistas relevantes sobre o perfil cognitivo de tais subgrupos, que podem contribuir para a proposição de projetos de intervenção junto a estes. No caso das altas habilidades, tais contribuições não têm necessariamente o objetivo de aceleração do desenvolvimento, mas especialmente de oferta de situações de aprendizagem que contemplem as assincronias de desenvolvimento cognitivo aqui empiricamente demonstradas, contribuindo para minimizar tais assincronias características do seu funcionamento e, conseqüentemente, subsidiando uma socialização mais eficaz destas crianças.


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