Superdotação, Asperger (TEA) e Dupla Excepcionalidade por Claudia Hakim

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terça-feira, 15 de março de 2011

3ª Parte do texto "Alfabetização precoce: condição para adiantamento escolar?

Vantagens e desvantagens


Estudo conduzido por Heinbokel (1997) aponta para o fato de que, dada a carência de atenção específica aos potenciais elevados, a aceleração é, às vezes, a única alternativa possível. Adverte também que os supostos "problemas" decorrentes do adiantamento são, muitas vezes, fruto das concepções antecipadas de quem vive a situação, portanto a menção a eles é inconclusiva. No caso da entrada precoce na escola, por exemplo, situações que sugiram imaturidade emocional da criança, como sentar no colo da professora, podem ser vistas com bons ou maus olhos, dependendo do professor.


Nos países europeus, as restrições ao adiantamento são provenientes dos pais que, quando alertados pela escola quanto ao desempenho superior de seus filhos, reagem temendo que eles percam a alegria de uma infância mais relaxada e com compromissos menos rígidos (Freeman, 1998).


Contrariamente, originam-se na escola, predominantemente nos EUA e na Austrália (Winner, 1998), quando diretores e professores opõem-se aos pais, que por sua vez argumentam que os filhos apresentam problemas de comportamento derivados da falta de interesse por assuntos exaustivamente repetidos. Observações informais da prática de atendimento a potenciais diferenciados mostram que o Brasil tende a alinhar-se com o pensamento norte-americano: normalmente são os pais que solicitam a aceleração.


Independente da proveniência, a decisão de acelerar a passagem do aluno pela escola deve ser avaliada com extremo cuidado, uma vez que trata de um delicado equilíbrio. Baseada numa análise compartilhada entre pais, escola e a própria criança, que conclua que esse é o único caminho possível para manter o interesse do aluno pelo estudo, essa decisão pode mostrar-se benéfica ao longo da vida escolar da criança.


McCluskey, Massey & Baker (1996, 1997), numa pesquisa longitudinal realizada com alunos que entraram precocemente no Jardim de Infância concluem que, a longo prazo, essa opção faz com que o desempenho escolar seja superior ao de crianças que ingressaram na escola na idade certa.


Do ponto de vista do indivíduo a ser adiantado, há que considerar que a diferença de ritmo e de nível é apenas uma dentre as muitas possíveis: de interesses, de habilidades, daquilo que hoje se denomina como múltiplas inteligências, e assim por diante. Como dito anteriormente, o desenvolvimento infantil não é homogêneo, e não há justificativa razoável para a opção de pretender atender apenas parte das diferenças existentes. Privilegiar os aspectos intelectuais e cognitivos, considerando-os mais relevantes que os emocionais e sociais, pode promover o isolamento da criança de seus pares, sugerindo para ela a possibilidade de que ser bem sucedida implica em afastar-se do que sente e do fértil terreno do intercâmbio social.


Decidir pela aceleração pode ser também uma opção que considere apenas o benefício do aluno a ser promovido, em detrimento tanto da classe onde ele está quanto daquela em que deverá ser inserido. A premissa do adiantamento pode ser, assim, extremamente individualista, baseada apenas no ganho que o aluno a ser adiantado possa vir a usufruir.


Com relação aos pedidos específicos de adiantamento de crianças de primeira série, além dos poucos exemplos de critérios encontrados e mencionados acima, algumas considerações podem ser feitas.


Em primeiro lugar, na 1a. série não se ensina apenas a ler e escrever. O aluno já alfabetizado, assim, está "adiantado" apenas com relação a um aspecto, importante sem dúvida, mas que não preenche as outras demandas desse nível de ensino, como o aprendizado dos elementos básicos da matemática, por exemplo. Além disso, é na 1a. série que o aluno é inserido na cultura da educação fundamental formal, mais arbitrária e restrita que a educação infantil. Aí se dá um significativo rito de passagem para o aprendizado de regras mais impessoais e para o desenvolvimento da responsabilidade do aluno para com seu desenvolvimento acadêmico.


É importante também considerar que saber ler e escrever não significa estar familiarizado com a linguagem, permitindo que a criança faça uso apropriado dela. Apenas aparentemente o aprendizado da leitura e da escrita é solitário. Nogueira (1993) afirma, entretanto, que "no contexto do trabalho pedagógico realizado pela escola, são inúmeras as formas de mediação que se estabelecem entre as crianças e o conhecimento. Entre elas destacamos a mediação do outro, que ensina e faz junto, permitindo a construção partilhada...". Esse outro pode ser o professor, o colega que sabe mais ou o que sabe menos.


A inserção do aluno "adiantado" numa classe em que esse processo já esteja num estágio mais avançado, como seria o caso da passagem direta para a segunda série, impede essa construção conjunta, e facilita a consolidação das lacunas características do aprendizado solitário, ou mediado apenas por um tipo de 'outro'.


Considerações finais


Podemos considerar que formar, mais que ensinar, pressupõe criar condições para que o aluno se envolva com aqueles que não são como ele, pedindo e oferecendo ajuda num movimento de consideração mútua e respeito ético pela diversidade, desde muito cedo. Retirar o indivíduo de um contexto que aparentemente limita seu desenvolvimento (porque pensa-se nele apenas do ponto de vista intelectual-cognitivo) deve ser uma decisão muito bem estudada, tomada na ausência de outras alternativas.

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