Extraído do site :
Transtorno de aprendizagem afeta a capacidade de escrever ou copiar letras, palavras e números.
Assim como em outros transtornos de
aprendizado, o tratamento da disgrafia é multidisciplinar e envolve
neurologistas, psicopedadogos, fonoaudiólogos e terapeutas.
Disgrafia: exercício mostra letra de adolescente de 14 anos (Reprodução/VEJA)
Com os cadernos de caligrafia fora de
moda nas escolas, a letra ilegível deixou de ser marca registrada apenas de
médicos e apressados. Atraídos pelo computadores, crianças e jovens tendem a
exercitar pouco a letra cursiva - antes treinada à exaustão nas folhas
milimetricamente pautadas. Assim, a hora da escrita pode virar um tormento:
tanto para quem escreve quanto para quem lê. Nas crianças em idade de
alfabetização, no entanto, a atenção de pais e professores deve ser redobrada.
Letra feia no caderno pode não ser apenas falta de jeito com o lápis ou caneta,
mas, sim, um transtorno de aprendizagem conhecido como disgrafia, que afeta a
capacidade de escrever ou copiar letras, palavras e números. O centro do
problema está no sistema nervoso, mais precisamente nos circuitos neurológicos
responsáveis pela escrita.
“A disgrafia pura ocorre ainda
durante a gestação e já nasce com a criança. Ela não é adquirida”, explica
Rubens Wajnsztejn, neurologista especializado em infância e adolescência. De
acordo com Marco Antônio Arruda, neurologista do Instituto Glia de Cognição e
Desenvolvimento, estudos apontam que a disgrafia é mais comum em meninos e é
detectada ainda na infância, depois que o processo de alfabetização é
consolidado, por volta dos oito ou nove anos. “A disgrafia pode ocorrer em
adultos também, mas somente quando ocorre uma lesão, como um derrame, que pode
comprometer a coordenação motora de mãos e braços”, afirma o médico. “Mas,
nesse caso, já não se trata mais de disgrafia pura”.
Ainda na infância, a dúvida é saber
quando a letra ilegível vai além da preguiça ou pressa e deve ser tratada como
transtorno. Um teste eficiente é pedir que a criança escreva algumas frases em
uma folha sem linhas, conta Raquel Caruso, psicomotricista e coordenadora da
Equipe de Diagnóstico e Atendimento Clínico (Edac). Se o resultado for uma
escrita lenta, com letras irregulares, retocadas e fora das margens, é hora de
preocupar-se. Além disso, os disgráficos têm dificuldades em organização
espacial: daí, a escrita em que as palavras parecem “subir e descer o morro”.
Os sintomas da disgrafia não se
referem exclusivamente à escrita. Alguns outros sinais de alerta podem ajudar
os pais antes mesmo da alfabetização dos filhos. “Se você leva a criança a uma
festa junina, por exemplo, observe se ela tem ritmo para acompanhar as músicas,
memória para fixar os passos e atenção aos movimentos”, diz Raquel Caruso. Se
observada alguma dificuldade nesse sentido, é hora de estimular a prática de
exercícios físicos como correr e nadar, além de brincadeiras como amarelinha,
pintura e recorte para estimular a parte motora dos pequenos. A falta dessas
atividades pode comprometer o tônus muscular, piorando a já difícil situação
dos disgráficos.
Rendimento escolar – É importante ressaltar que a
disgrafia não compromete o desenvolvimento intelectual da criança nem é um
indicador de que o Q.I. (quociente de inteligência) dela é baixo. Silvana
Leporace, coordenadora do serviço de orientação educacional do Colégio Dante
Alighieri, em São Paulo, reforça: “Geralmente, os disgráficos são alunos muito
inteligentes. A comunicação oral deles é muito boa, mas, na hora de colocar as
ideias no papel, eles têm muita dificuldade”, conta.
É esse desdobramento do problema que
pode prejudizar o rendimento do aluno. Devido à dificuldade no ato motor, a
criança demora mais a realizar algumas atividades, em comparação a seus
colegas. É o caso de tarefas simples como copiar a lição da lousa. Outra
situação típica: a professora pede que os estudantes redijam um texto, e o
disgráfico, envergonhado pela a letra feia, conclui que nem vale a pena
escrever. “Isso abala a autoestima da criança”, diz Sônia das Dores Rodrigues,
da Faculdade de Ciências Médicas da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp). Diante do obstáculo, ele deixa de aprender.
Sem o treinamento exaustivo da caligrafia,
a atenção na escola deve ser redobrada. “Se o treinamento da letra cursiva
existe desde cedo, é possível encontrar os disgráficos. Com a prática em
desuso, os professores e pais podem confundir digrafia com preguiça”, alerta
Marco Antônio Arruda. “Mas a letra feia pode ser treinada e as crianças tidas
como preguiçosas têm as habilidades necessárias para escrever bem. Já as
digráficas, não: elas não tem habilidade e precisam de tratamento.”
Como tratar – Assim como em outros transtornos de
aprendizagem, o tratamento da disgrafia é multidisciplinar e envolve
neurologistas, psicopedadogos, fonoaudiólogos e terapeutas. Medicamentos só são
indicados quando existem outros transtornos envolvidos, como déficit de atenção
(DDA) ou hiperatividade.
Em relação à parte motora, Raquel
Caruso, do Edac, afirma que é necessária uma preparação prévia do paciente, com
exercícios mais amplos, para depois chegar à escrita. “O ponto principal é
trabalhar com o corpo, com exercícios como manusear a argila e massagens, e depois
partir para o específico, que é a escrita e outros problemas, como o de
memória”, explica.
“Vemos apenas o produto final, que é a letra ilegível, mas
existe muita coisa por trás disso”. O tratamento pode levar meses e até anos,
variando conforme o caso. O objetivo não é atingir a letra bonita, mas, sim,
legível. E dar uma forcinha para o processo de aprendizado das crianças.
Nenhum comentário:
Postar um comentário