Extraído do site : http://www.cartanaescola.com.br/single/show/390
Prática pedagógica Estudos no
Brasil e nos EUA apontam novos dados sobre o que traz efeito
positivo e negativo

Em
tempos em que se discutem as novas metodologias de ensino, a velha lição de
casa apareceu como protagonista em duas pesquisas sobre o que faz diferença no
aprendizado dos alunos. Uma, brasileira, mediu ganhos apresentados quando um
professor sempre adota determinadas práticas. Outra, americana, cruzou dados
escolares de três décadas com a participação dos pais. A primeira conclui que o
hábito de passar tarefa extraclasse tem impacto positivo. A segunda, que a
ajuda dos pais no dever de casa tem efeito nulo ou negativo na formação.
Colocados juntos, os recados podem ser lidos assim: lição de casa funciona e
independe de as famílias serem participativas.
O
efeito do acompanhamento dos pais chocou até mesmo os autores do levantamento
nos Estados Unidos, os sociólogos Keith Robinson, da Universidade do Texas, e
Angel Harris, da Universidade Duke. “Ficamos assustados com o que encontramos”,
escreveram no artigo publicado no New York Times sobre o estudo, considerado o
mais extenso e completo já feito sobre o tema.
A
análise compila informações de famílias ao longo das três últimas décadas.
Foram usadas 63 diferentes bases de dados para medir o envolvimento dos pais
com os estudos dos filhos e analisado o desempenho dos alunos desde os
primeiros anos do Ensino Fundamental até a faculdade. Informações demográficas,
étnicas, sociais e econômicas também foram aplicadas para que as comparações
fossem feitas entre grupos similares.
Independentemente
do contexto, crianças que recebiam ajuda regular com o dever de casa tiveram
desempenho acadêmico pior do que a média.
Apesar
de ponderarem que o resultado não significa um efeito nocivo na participação da
família nos estudos de forma geral, os autores incentivam as escolas a serem
mais específicas no que deve ser o acompanhamento da vida escolar das crianças
. Para eles, os pais deveriam estimular os estudos e valorizar a escola, mas
deixar que os filhos vivenciem sozinhos os desafios ou, em suas palavras,
“preparar o cenário e deixar que as crianças atuem”. Em relação às tarefas
extraclasse o conselho é direto: pais não ajudem.
Isso
leva à segunda pesquisa feita na rede pública paulista com dados do Sistema de
Avaliação do Rendimento Escolar do Estado de São Paulo (Saresp).
A partir das
notas e das respostas dos questionários nos exames de 2007 e 2009, o economista
Claudio Ferraz, da PUC-Rio, e o pós-doutorando da Faculdade de Economia da
Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto, Maurício Fernandes, analisaram
quanto os estudantes ganharam em desempenho de Matemática e Língua Portuguesa
em dois anos.
Em
seguida, separaram por grupos as turmas em que, conforme respostas dos
estudantes, sabia-se que os professores costumavam adotar algumas práticas
pedagógicas frequentemente ou sempre. Aqueles que tiveram educadores que
passavam lição de casa todos os dias atingiram média de ganho 10% maior em
Matemática e 14% maior em Língua Portuguesa do que os demais. “Foi um
resultado muito expressivo, porque se trata de algo que os alunos sabem medir,
outras informações, como contextualização, são mais subjetivas”, comenta Fernandes.
A
pesquisa também comparou os ganhos com os que são obtidos por alunos cujos
professores se saem melhor em suas próprias avaliações de conhecimento. Embora
também haja diferença, ela foi de apenas 1%, muito menor do que a obtida pela
lição de casa recorrente.
Para
ele, o fato de os alunos terem de refletir sobre o que aprenderam para fazer
algo fora da escola ajuda a capturar a atenção da turma e levá-la a entender o
material visto em aula. Além de representar maior tempo de estudo, a lição de
casa, por ser pensada como algo que crianças e adolescentes possam fazer
sozinhas, tem um caráter mais reflexivo. “Ao analisar outras práticas elencadas
pelos alunos que parecem fazer diferença como ‘explicar a matéria’ e
‘relacionar os conteúdos com o cotidiano’ temos também indicativos do que mais
dá resultado: atividades aplicativas, analíticas e críticas”, afirma o
doutorando.
A
parcela de alunos da rede pública paulista que tem lição de casa
rotineiramente, no entanto, é bastante pequena. Segundo as respostas dos
estudantes nas edições do Saresp analisadas, apenas 14% dos professores de
Matemática e 5% dos de Língua Portuguesa sempre passam tarefas para fazer após
as aulas. “A maioria não tem esse hábito e aí foi o intuito da pesquisa:
mostrar que algumas práticas pedagógicas dão tanto ou mais resultado do que
conhecimento de conteúdo”, conclui Fernandes.
Na
rede municipal de São Paulo, a obrigatoriedade da lição de casa foi um dos
pontos criticados no Programa Mais Educação, instituído no ano passado. A defesa
da prática foi feita para que a sociedade participe mais da formação das
crianças a partir da responsabilidade prevista na Constituição Federal. Alguns
educadores discordam por entender que se trata de transferir a responsabilidade
do Estado para uma população sem condições.
O
diretor de Orientação Técnica da Secretaria de Educação, Fernando José de
Almeida, explica que a diretriz não tem exatamente o objetivo de aumentar a
nota dos alunos, mas suas oportunidades de aprendizado. “Muitas pesquisas apontam
que a escola não tem mais a importância que tinha há 60 anos. Portanto, hoje o
aprender se faz em várias esferas, na rua, no ônibus, em casa, o tempo todo.
Cabe à escola incentivar que isso ocorra”, diz.
Para
ele, não cobrar lição de casa de alunos de escola pública ou carentes é uma
visão preconceituosa. “Em qualquer escola séria, quando o professor acaba
a unidade, diz aos alunos o que eles precisam fazer antes da próxima aula. No
universo imaginário de muitos educadores nossos estudantes são coitados que não
têm uma mesa para sentar e estudar, e, portanto, não deviam ter lição de casa.
Acho uma imbecilidade. Penaliza duplamente os quem têm menos recurso. É melhor
na cozinha, do que ter também esse direito a menos do que os alunos de
escola particular”, afirma.
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