Superdotação, Asperger (TEA) e Dupla Excepcionalidade por Claudia Hakim

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domingo, 14 de dezembro de 2014

Leiam a reportagem em que fui entrevistada, falando sobre Superdotação

Extraído do site : http://www.osemanario.com.br/blog/index.php/2014/12/menino-de-dois-anos-que-ja-sabe-o-alfabeto-e-conta-ate-39-apresenta-indicadores-de-superdotacao/

Menino de dois anos que já sabe o alfabeto e conta até 39 apresenta indicadores de superdotação


(Foto: Laila Braghero/O Semanário)
Pequeno capivariano pode estar entre os cerca de oito milhões de brasileiros com altas habilidades
CAPIVARI – Com menos de um ano, Murilo já completava o abecedário para surpresa da mãe, a ex-organizadora de eventos e professora de educação infantil Angela Bellini de Oliveira, 40. “Eu brincava com ele enquanto trocava a fralda. Eu dizia ‘A, B, C’ e ele ‘D’; ‘E, F, G’ e ele ‘H’”. Hoje, com dois anos recém-completados, o menino conhece todas as letras do alfabeto, lê os números até dez e conta até 39, além de saber o nome e imitar uma porção de bichos.
“Quando o levo na creche a pé, no carrinho de bebê, ele vai falando os números das casas. Parece um processador, não desliga nunca. Por isso eu fico até preocupada. Mas não é uma coisa nossa”, conta Angela. Ela e o marido, o motorista Ricardo Alexandre de Oliveira, 37, notaram os primeiros indicadores de superdotação em Murilo depois que familiares e amigos chamaram a atenção do casal.
Começaram, então, a estimular a curiosidade da criança com vídeos e jogos educativos, e pediram que as pajens da Escola de Educação Infantil (Emei) Professora Maria Aparecida Boaventura de Almeida Garcia, na qual o menino passa quase oito horas por dia, fizessem o mesmo. Mas nada é imposto. “Foi brincando.” Os pais dizem que só não tentaram fazer com que o filho lesse, porque acham muito cedo.
Na creche, ele troca os carrinhos por brinquedos com letras e números. “E é dele mesmo, porque os outros não têm nenhuma curiosidade. Com duas semanas que ele nasceu já estava vendo Galinha Pintadinha. Aí eu descobri outro vídeo que canta as vogais, os números. Mas agora ele não se interessa mais. Eu coloco A, E, I, O, U, que é uma musiquinha, e ele não quer mais, porque é pouco.”
Por ser muito novo, Murilo ainda não foi submetido a nenhuma avaliação para diagnosticar o que hoje também pode ser chamado de altas habilidades. Porém, tais características apontam que o pequeno capivariano pode ser um dos cerca de oito milhões de brasileiros superdotados, de acordo com o Conselho Brasileiro para Superdotação (ConBraSD), o que equivale a 5% da população do país.
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Na creche, o menino troca os carrinhos por brinquedos com letras e números (Foto: Laila Braghero/O Semanário)
Nas salas de aula, duas a cada três crianças são superdotadas, também de acordo com o Conselho. O Censo Escolar 2010, no entanto, identifica apenas 12 mil alunos. Segundo a presidente do ConBraSD, Susana Graciela Pérez Barrera Pérez, mestre e doutora em Educação e especialista em Educação Especial na área de Altas Habilidades, faltam políticas públicas de capacitação de professores, para que esses profissionais sejam capazes de identificar e atender aos alunos superdotados na escola, levando, consequentemente, números reais ao Ministério da Educação (MEC).
“É uma situação bastante complicada e que reflete nos números do Censo. Quer dizer, 12 mil alunos, quando deveríamos ter, no mínimo, dois milhões e meio cadastrados. É um número muito pequeno. Aí não tem aluno registrado no Censo, pra que fazer política pública? É uma bola de neve: não tem pessoas qualificadas – não se identifica – não vai pro Censo – não tem política pública. Com isso, não tem nem como exigir formação. Mas essa identificação e o registro no Censo dependem de formação, que é política pública. Então é meio paradoxal.”
Apesar disso, Susana recomenda que os pais, ao notarem indicadores de altas habilidades nos filhos, procurem profissionais da saúde para a realização de testes psicológicos, neuropsicológicos e de inteligência, a fim de avaliar também aspectos comportamentais, afetivos e motores. “Por enquanto eu posso te dizer que esse menino tem uma habilidade acima da média”, afirma a especialista sobre Murilo.
Isso porque, de acordo com ela, superdotação não se resume em ter habilidades acima da média. Ler, escrever ou tirar uma pontuação alta no teste de QI (acima de 110) não é suficiente. “Além da habilidade acima da média, essa criança tem que ter nível elevado de criatividade e nível elevado de comprometimento com a tarefa na área em que ela tem habilidade acima da média.”
A advogada especialista em Direito Educacional Claudia Hakim, pós-graduada em Neurociências e Psicologia Aplicada, explica que a escola pode fazer o papel de encaminhar o estudante a um especialista e oferecer uma proposta pedagógica prevista na lei. Entretanto, as instituições de ensino pouco sabem ou não aplicam métodos voltados às crianças superdotadas.
Claudia, que também é consultora jurídica na área de Superdotação e autora do blog Mãe de Crianças Superdotadas, como o próprio título sugere tem dois filhos com altas habilidades. No Facebook, criou um grupo com o mesmo nome, em 2010, e que já reúne mais de 3.400 membros, para informar pais e mães sobre o tema, por meio do compartilhamento de conhecimento e experiências.
Segundo ela, não está na hora de submeter Murilo a avaliações. A idade dele permite apenas um acompanhamento. “Até acho importante, porque algumas condições não necessariamente indicam superdotação. Um acompanhamento nesse momento por um neuropsicólogo ou neuropsiquiatra, estimular por conta em casa.” Mas alerta: “se houver choros frequentes e dificuldade de se relacionar, se [a criança] for muito agitada, tem que ver. Tem que estimular outras áreas também, não só a intelectual”, pontua.
“Como mãe, a gente fica super orgulhosa, quer mostrar, acaba cobrando da criança que ela vai ser amada porque ela é inteligente. Eu sempre oriento pra ver a criança como um todo, procurar atender e achar um caminho, mas não deixar ser só isso: estimular o social, brincar, ter amigos, fazer esporte. A superdotação é uma questão genética e ambiental, e a falta de reconhecimento pode trazer prejuízos”, como a depressão, por exemplo.
Ainda de acordo com a advogada, os testes podem ser feitos, em média, a partir dos cinco anos, e são o meio mais seguro de certificar se a criança tem, em vez de altas habilidades, Síndrome de Asperger ou outro tipo de autismo, cegueira, surdez, problemas emocionais, psicológicos, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDHA) ou duas dessas disfunções combinadas.
Susana, por sua vez, garante que já é possível fazer a identificação aos dois anos. “É cedo, mas a gente percebe os indicadores. Além disso, a Política Nacional de Educação Especial diz que o atendimento deve ocorrer desde a educação infantil, ou seja, a partir do zero ano, até o ensino superior. Quer dizer, eles [a família] têm amplo suporte legal para reivindicar o atendimento.”
(Foto: Laila Braghero/O Semanário)
Murilo ainda não foi submetido a testes para diagnosticar a superdotação porque é muito novo (Foto: Laila Braghero/O Semanário)
Políticas públicas
Em 2006, o MEC, por meio da extinta Secretaria de Educação Especial (SEESP), implantou 27 Núcleos de Atividades de Altas Habilidades/Superdotação (NAAH/S) nas capitais dos estados brasileiros e no Distrito Federal. Segundo Claudia Hakim, esses núcleos são capazes de identificar e trabalhar com as crianças superdotadas, mas poucos ainda funcionam.
“Em São Paulo tem, mas não atende. Então é como se não tivesse. No Rio Grande do Sul também está extinto. São núcleos com duas a 30 pessoas atendendo. Em São Paulo, por exemplo, tem duas pessoas. Como faz pra atender todo o estado? Até porque, estão nas capitais. Imagine o Amazonas todo sendo atendido em Manaus. É impossível”, acrescenta Susana Pérez.
Segundo a presidente do ConBraSD, em termos de América Latina o país tem boa legislação, mas é carente no que se refere às altas habilidades. “A gente tem garantido somente o atendimento na educação: os meninos são identificados, mas não tem professor preparado pra atender. E nós precisamos que haja uma interlocução com a cultura, com a assistência social, com a saúde.”
Conforme definição do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), estudantes com altas habilidades/superdotação demonstram potencial elevado nas áreas intelectual, acadêmica, liderança, artes e psicomotricidade (estudo do homem por meio do corpo em movimento em relação ao mundo interno e externo), isoladas ou combinadas. Nessa linha, Susana defende a implantação de ingressos gratuitos para essas crianças em museus, cinemas e teatros, possibilidades de trabalhar em laboratórios universitários e participação em oficinas.
Todos os pequenos superdotados deveriam pelo menos receber o Atendimento Educacional Especializado (AEE) nas Salas de Recursos Multifuncionais. Isso se houvesse preocupação real do MEC, critica Susana. “Não tem pessoal qualificado. Aí a criança não é sequer indicada pra ir à Sala de Recursos. E quando é, o profissional que atende lá diz ‘eu não sei como atender’, e acaba não sendo atendida.”
(Foto: Laila Braghero/O Semanário)
Se houver diagnóstico positivo para altas habilidades, os pais estão amparados na legislação para garantir ao filho educação especial (Foto: Laila Braghero/O Semanário)
Nos dias atuais, a educação especial brasileira é de responsabilidade da Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (Secadi), que também engloba alfabetização, inclusão, atendimento a quilombolas, negros, gays e idosos. “Tudo o que é diferente entra lá.” E, para Susana, isso dificulta a destinação de recursos e criação de políticas públicas para essa parcela da sociedade.
Mesmo assim, a especialista reforça que Angela e Ricardo podem e devem exigir que Murilo seja acolhido pelo Estado. O primeiro passo, recomenda, é procurar a Secretaria da Educação do município. Ela tem obrigação de oferecer o atendimento. Se a Secretaria não atender a demanda, o Ministério Público (MP) estadual deverá ser acionado. “E caso o MP não saiba, nós temos leis que garantem o atendimento. O Ministério Público tem como tomar medidas para que essas crianças sejam atendidas, mas alguém tem que fazer a denúncia.”
Outros casos
A médica Tatiana, 34, que preferiu ter o sobrenome preservado, teve a filha Fernanda, hoje com sete anos, identificada aos dois. Ela já lia livros, tinha vocabulário avançado para a idade, curiosidade por assuntos diversos e gostava de brincar na companhia de crianças mais velhas. Apesar de nova, a mineira, que vive em Brasília, levou a pequena em uma psicóloga especialista em altas habilidades, que descartou Síndrome de Asperger e detectou precocidade em múltiplas áreas.
“Ela começou a reclamar que as crianças da turma não sabiam conversar direito e que cheiravam mal, porque usavam fralda.” Com um ano e meio, a pediatra da menina também já havia notado alguns indícios. “Ela foi a uma consulta e falou o nome todo, idade com os meses e todas as cores. Me lembro que chamou a atenção dela porque ela mostrou uma figura de revista com uns cachorros. Disse que naquela idade o esperado seria que a criança, no máximo, dissesse ‘au-au’, e minha filha falou ‘dois cachorros correndo na grama’.” Aos cinco, Fernanda fez os testes e o diagnóstico foi confirmado.
Anna Cecília, 5, chegou ao NAAH/S Recife com um ano e sete meses, de fralda, mamadeira e lendo de maneira fotográfica. “Em poucos minutos foi identificada a precocidade e, desde então, passamos a ser acompanhados sem que ela frequentasse as oficinas, por causa da pouca idade”, conta a assistente social Ana Sandra de Arruda Souza Leão, 42, de Cabo de Santo Agostinho (PE).
A menina passou a frequentar o núcleo aos dois anos. “Estive com a psicopedagoga que a acompanha e com a coordenadora que a recebeu na época e, após me entregarem um relatório bem maior do que os anteriores, a equipe informou que a Anna equilibrou o desenvolvimento linguístico com o raciocínio lógico e que eles já podem dizer sem medo de errar que a Anna Cecília tem AH/SD, e que é autodidata.”
A filha de Ana Sandra também tem um pouco de medo de fogos de artifício, mas qualquer outro tipo de diagnóstico foi descartado. “Sugeriram que continuemos com a terapia e que ela deve continuar nas oficinas do NAAH/S. Deixo a mensagem que escutei no primeiro dia que cheguei lá com meu bebê travesso, sabido e com energia de sobra, pedindo ajuda: ‘mãe, a receita é amor e paciência’.”
Já a história da estudante de Direito Débora Cristina Coelho Bensi, 39, de Santo André, foi um pouco diferente. Descobriu que Guilherme, 13, tinha superdotação e, Alexandre, 8, Síndrome de Asperger. “O Guilherme foi diagnosticado antes de um ano, mas foi avaliado aos oito, depois de uma crise terrível de tédio e pressão escolar. Alexandre, meu outro filho, leu antes dos dois anos e é uma criança nota dez na escola, mas tem Asperger”, mania de falar em código, de fazer gincanas e tem alergia ao corante amarelo Tartrazina, como gosta de informar.
A creche na qual Débora deixava Guilherme dizia que o menino era fora do padrão e não sabia como lidar com ele. Já o pediatra contava que ele realizava tarefas que condiziam com uma criança de dois anos. “Ele sentava diante dos brinquedos educativos e fazia direitinho o trajeto, a montagem dos bloquinhos. Aos dois, fazia coisas lindas com o Lego. Era muito criativo”, recorda.
(Foto: Laila Braghero/O Semanário)
Menino é quieto, educado, diz ‘por favor’ e ‘dá licença’, segundo a mãe (Foto: Laila Braghero/O Semanário)
Descobertas
Há sete anos em Capivari, a mãe de Murilo é proprietária de uma loja de roupas desde abril. Fruto de uma união que começou em um pagode, o menino já está ganhando responsabilidades: cuidar do irmãozinho que está por vir. “Ele vai ajudar, vai ensinar. Porque ele é muito carinhoso. Eu acho que ele vai proteger”, diz Angela Bellini de Oliveira, grávida de cinco meses.
Além de quieto e educado, daqueles que diz “por favor” e “dá licença” desde cedo, o garoto também é sensitivo, segundo a mãe. “Eu acho que foi ele quem descobriu primeiro [a gravidez]. Eu estava com ele deitada, ele no berço, e eu precisava ir ao banheiro, de manhãzinha, e ele não deixava, queria ir comigo, grudado, não queria ficar com o pai.” Logo após o episódio, decidiu fazer o teste de farmácia.
“Eu fico boba, né? Por não ter tido filhos antes e agora ver esse crescimento do Murilo, ele falando. Mas eu achava normal. Ele [o marido] também achava normal. Ontem acordou, perguntou da chupeta e começou a conversar comigo”, conta a mãe, deslumbrada. “Um assunto, conversando mesmo, trocando ideia sobre a chupeta, que perdeu, que estava aqui em cima, perguntando se podíamos procurar. Cada dia é uma nova descoberta.”

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