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Maria Cecília Castro Gasparian
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Antes de responder suas perguntas
quero dizer que quando falamos de crianças e adolescentes com talentos
especiais, ou superdotados, estamos entrando no campo da complexidade e dos
grandes desafios. Os estudos sobre essas características ainda são incipientes
e pouco conclusivos. Os testes de QI eram e continuam sendo ainda os mais usados,
porém eles, atualmente, apenas nos dão pistas sobre esses indivíduos e tem
provado que pouco podem ajudar estes indivíduos a terem sucesso nas suas
atividades, principalmente quando adultos. Ser superdotado não é passaporte
para o sucesso, muito pelo contrário, as pessoas que assim são, sofrem por não
compreenderem os outros e a si mesmas, com isso são discriminadas na escola, no
trabalho, são perseguidas, excluídas, são invejadas e constantemente testadas,
exploradas e mal entendidas. Sofrem frequentemente de ansiedade, angustia e
depressão e se isolam tornando-se o “anti-social” da turma e mais tarde da
sociedade. Os pesquisadores neste campo estão estudando as diversas formas de
como isso ocorre e as suas inúmeras manifestações e nuances, porém pesquisam-se
apenas as pessoas com níveis intelectuais e cognitivos acima da média e as
crianças e adolescentes que demonstram altas sensibilidades espirituais? Essas,
então, nem são pesquisadas porque a Ciência atual ainda não tem instrumentos
para verificação e observação. São crianças e adolescentes que estão um passo
além de seu tempo. A questão ética e moral, sempre questionada por eles são
constantemente ignoradas pelos adultos. Temos que, como Psicopedagogos,
estarmos atentos a essas crianças e só um olhar diferenciado poderá auxiliá-las
a conviver com seus atributos.
Quais diferenças na
prática psicopedagógica são adotadas no trabalho com famílias com crianças e
adolescentes com talentos excepcionais?
Começo respondendo sua pergunta
com uma orientação de Maude Mannoni que diz que “os pais inconscientemente
deixam a seu filho a carga de refazer sua história, mas refazê-la de tal
maneira que nada deveria mudar, apesar de tudo. O paradoxo em que a criança está
presa produz logo efeitos violentos; com efeito, raramente há oportunidade de
que a criança se realize em seu próprio nome”. Tenho observado ao longo
de minha prática psicopedagógica, o desejo dos pais na vocação artística do
filho visando mais o seu próprio sonho a ser realizado do que o próprio filho
desenvolver sua aptidão ou sua vocação seja qual for. Essa afirmação serve para
todas as famílias com crianças e adolescentes que apresentem algum talento fora
dos padrões normais, assim como para as famílias que apresentem alguma forma de
sofrimento, seja ele qual for, seja qual for o motivo.
Quais são as
queixas mais comuns dessas famílias e do indivíduo superdotado?
As queixas mais frequentes das
famílias são: rebeldia, auto-independência, arrogância, enfrentam e questionam
tudo, falta de limite prejudicando suas atividades em classe. Por outro lado as
queixas do indivíduo superdotado são: a falta de amigos, a escola e as aulas
são aborrecidas, apresentam com freqüência quadro de depressão, isolamento. As
queixas diferem muito de família para família e de indivíduo para indivíduo.
Como as famílias
lidam com a criança portadora de talentos excepcionais?
Como essas crianças (chamadas de
precoce) apresentam habilidades superiores à sua idade, num primeiro momento os
pais sentem orgulho e estimulam cada vez mais essas habilidades, mas com o
passar do tempo isso começa a incomodar, prejudicando o desenvolvimento
integral da criança. Muitas crianças, por exemplo, diagnosticadas como
portadoras de TDAH são crianças talentosas que não tiveram a atenção adequada
dos pais e da escola. Não quero dizer com isso que todas as crianças portadoras
de TDAH sejam superdotadas, e nem que todas as crianças superdotadas apresentem
características de TDAH, isso é apenas uma exemplificação.
É uma tarefa
difícil orientar essas famílias?
Na realidade quando uma família
nos procura ela já está cansada de sofrer. Sofrem porque não entendem o que
está acontecendo, sofrem por não saberem como agir com seu filho, em fim, elas
vem em busca de ajuda para poderem ser mais felizes. Quando descobrem que seu
filho ou filha tem talento para alguma coisa e não tem habilidade para outras,
no início se sentem frustradas, depois vão aceitando e começam a ver a vida de
uma forma mais fácil e mais “normal”, a ansiedade e a angustia são mais
controladas e a vida familiar passa a ter mais equilíbrio.
Que problemas que
enfrentam dentro das instituições educacionais?
Muitas escolas não sabem como
lidar com essas crianças e adolescentes e, como as famílias, discriminam essas
crianças, às vezes cobram de mais, outras exigem bem menos. Essas crianças
frequentemente enfrentam a inveja dos outros, são discriminadas e rejeitadas
por seus pares.
Talentos
excepcionais têm necessidades educativas especiais?
Se a Educação fosse realmente
boa, se os professores melhores preparados e as escolas servissem para o que
realmente escrevem como objetivos e missão da instituição, penso que não seria
preciso uma ação educativa diferenciada, já que para mim todos os indivíduos
são especiais e cada um tem um talento e uma habilidade específica.
Crianças com
talentos excepcionais são marginalizadas? De que forma?
Às vezes sim, são marginalizadas
por seus pares. Às vezes elas mesmas se isolam, ou por acharem as outras
crianças de sua idade muito infantis, ou por não terem a habilidade do
relacionamento próprio da idade cronológica.
A sociedade
normalmente premia talentos excepcionais, em que medida isso é saudável?
Particularmente não sou favorável
a este tipo de conduta já que penso que todos têm seu talento especial, todos
são pessoas únicas. Enquanto a sociedade premiar talentos intelectuais e
cognitivos não dará condições de outros talentos se desenvolverem. Não vejo
como salutar este tipo de premiação, nem para o premiado e nem para a
sociedade. Pergunto: o que este Ser fará com o prêmio? Para que serve isso?
No Brasil, existem
escolas especiais, que tenham um ambiente estimulante, e que visem o
desenvolvimento dessas crianças?
Existem muitas instituições que
investem em ambientes mais estimulantes para todas as crianças. São
instituições que investigam esse tipo de comportamento e desenvolvimento
cognitivo.
Que mensagem deixa
aos congressistas, participantes e a todos os psicopedagogos?
Olhem sempre todas as crianças
como seres superdotados. Porém dirijam seu olhar psicopedagógico para todos nós
que estamos em desenvolvimento social, intelectual, afetivo e espiritual e que
precisamos de muito afeto, amor, atenção e respeito. Mesmo as crianças com um
talento especial em um campo determinado não tem habilidade em outras áreas.
Todos nós estamos no mundo para aprendermos a ser melhores e os chamados
superdotados não estão fora desta etapa do desenvolvimento evolutivo. Eles
estão no mundo para aprenderem a ser melhores do que são. Portanto não tenham
medo de trabalhar com “gênios”, superdotados, talentosos, ou outro nome que
queiram dar. Todos nós somos talentosos e se nos dedicarmos com amor, estudo,
observação, carinho, humildade, coerência, espera, respeito e desapego, tenho a
certeza que estaremos fazendo um excelente trabalho para o desenvolvimento da
humanidade.
Maria Cecília Castro
Gasparian - Mestre e Doutora em Educação: Currículo PUCSP.
Pedagoga, Psicopedagoga Clínica e Institucional PUCSP, Terapeuta de Família,
Membro da AMCE Associación Mundial da Ciências de la Educación, Pesquisadora do
GEPI Grupo de Estudos e Pesquisa da Interdisciplinaridade da PUCSP
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