Durante o século XX, superdotado era alguém capaz de decorar conteúdos enciclopédicos ou resolver enunciados complexos. Os esforços para avaliar a inteligência a partir de testes ganharam fôlego com as ideias do psicólogo francês Alfred Binet, no início do século passado. Foi quando as autoridades francesas pediram que Binet criasse um instrumento capaz de prever quais crianças teriam sucesso nos liceus parisienses. Então, ele criou uma escala de inteligência, com 30 tarefas mentais graduadas em função da idade. Esse instrumento era capaz de mostrar se o desenvolvimento da criança era igual ao das colegas, atrasado ou adiantado. Daí o teste quociente de inteligência, o QI! E o felizardo que estourasse em pontos era inteligentíssimo.
Mas não
é bem assim. Eles foram logo considerados uma
armadilha. Seriam tendenciosos, porque exigem, por exemplo, a
familiaridade com as expressões e o vocabulário embutidos nas questões. Outro
ponto criticado por ela é que os testes não avaliam outros elementos como
liderança, habilidade para interagir, imaginação e determinação. E tem
mais : esses testes avaliam apenas respostas certas dentro de um intervalo de
tempo, são padronizadas. "O que fazer, então, quando as respostas são
originais ?", questiona Nara. E o mais perigoso em tudo isso : "Os
resultados desses testes de inteligência são supervalorizados e aceitos com
muita facilidade, rotulando algumas crianças", critica.
"O importante, tanto para a escola, quanto
para a família, não é rotular, e sim criar formas adequadas da criança
ou do jovem desenvolver seu potencial"
Avessos
aos testes de QI, hoje os especialistas recorrem a outro arsenal para detectar
a inteligência, como check-list, autoavaliação,
observação, participação de professores e testes. O primeiro passo é
levantar um histórico da criança a partir do relato dos pais. A criança passa
por um extenso período de observação em seu ambiente de aprendizagem na escola
ou em uma sala de recursos. O profissional coleta dados sobre seus interesses,
sua forma preferida de aprender e sua produção. A criatividade também é avaliada.
"Podem ser aplicadas provas acadêmicas de uma série acima. Isso permitirá
ver as estratégias que ela usa para elaborar um problema que ela ainda não
conhece formalmente. Se a área de talento for música ou artes plásticas, por
exemplo, um expert deverá avaliar o caso", diz Maria Clara Sodré,
professora da PUCRJ e autora de Educação de Superdotados: Teoria e Prática, da
Editora Pedagógica e Universitária.
Para ela, o talento precoce é uma pista valiosa na
hora de identificar o superdotado, já que o talento dele tende a desabrochar
muito cedo. Em geral, os pequenos desenvolvem espontaneamente a sua
habilidade : são crianças que aprendem a ler sozinhas ou que desmontam o
computador sem causar estragos. Na mais tenra idade, mostram familiaridade com
instrumentos musicais, têm um vocabulário elaborado, raciocínio ágil ou memória
fora do comum. "A precocidade faz com que a criança seja capaz de fazer
coisas típicas de crianças mais velhas e se desenvolver mais rápido e ter um
talento superior", explica Maria Clara. Como Gardner, ela acredita
que a inteligência é uma mistura de dois ingredientes : a bagagem genética e a capacidade da pessoa conquistar
esses talentos ao longo da vida. "Existe uma inteligência
herdada que poderá ou não ser desenvolvida. Se a criança não recebeu essa
herança, ela terá dificuldade em aprimorá-la. Por outro lado, se ela nasce com
alguma desenvoltura e não tem oportunidade de desenvolvê-la, não terá muito
potencial", argumenta.
Mãe de três filhos talentosos, a psicóloga Ângela
Virgolim, professora da UnB (Universidade de Brasília), também não vê com bons
olhos o uso dos testes, embora admita que eles são úteis para avaliar uma
criança com notas baixas na escola, por exemplo, por causa de desmotivação ou
problemas emocionais. "As pessoas nos procuram para fazer um
teste de QI ou para 'diagnosticar' um filho que pode ser ou não superdotado.
Mas temos que fugir destas armadilhas.O importante, tanto para a escola, quanto
para a família, não é classificar ou rotular, e sim criar formas mais adequadas
da criança ou do jovem desenvolver seu potencial", completa Ângela, que
estudou com a equipe de Renzulli durante a defesa do seu doutorado pela
Universidade de Connecticut.
Não há consenso entre os especialistas. O fato é que a ciência ainda não encontrou uma fórmula para medir com precisão quem é superdotado. "Se o conceito de inteligência se basear numa noção estática, será usado um ponto de corte nos resultados do teste para selecionar quem deve entrar no programa e quem deve ficar de fora. Renzulli, por exemplo, acredita que a superdotação poderá aparecer em um momento e desaparecer em outro, fruto do contexto em que a criança vivencia."Assim, ela precisa ser sempre avaliada para ver se o programa está realmente desenvolvendo seu potencial", diz Ângela.
Quem quiser saber mais informações sobre locais para se avaliar crianças superdotadas ou até mesmo adultos, mandem um e-mail prá mim : claudiahakim@uol.com.br
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