Extraído do site : http://www1.folha.uol.com.br/equilibrioesaude/1166239-separar-alunos-entre-burros-e-espertos-define-o-desempenho-escolar.shtml
Artigo extraído do
Jornal “A Folha de São Paulo”, de 9 de Outubro de 2.012 – Seção Equilíbrio
JULIANA CUNHA
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Espere que uma criança vá mal na escola e ela não o
desapontará. A partir dessa certeza, o educador Robert Pianta,
reitor da Escola de Educação Curry, da Universidade da Virgínia, nos EUA, acaba
de publicar sua pesquisa baseada em um estudo da década de 1960 com alunos de
nível fundamental.
Aquele trabalho provara que a opinião do professor sobre
a capacidade de um aluno interfere em seu desempenho. Agora, Pianta, 57,
revisitou a conclusão para defender que professores sejam treinados a ocultar
suas crenças em relação aos alunos.
Professores tratam melhor estudantes tidos como mais
inteligentes, o que favorece o desempenho escolar desses.
O reitor criou um método que promete amenizar a influência da opinião do educador sobre o aprendizado. Nesta entrevista à Folha, ele diz como isso pode ser feito.
*
Folha - O que faz um professor achar que determinado
aluno não tem potencial ?
Robert Pianta - Em geral, o
"histórico" do estudante. O fato de ele não ter
demonstrado bom rendimento em anos anteriores faz com que o novo professor já o
encare como alguém que não tem muito a oferecer. Se esse aluno tirar notas
medíocres o professor já se dá por satisfeito.
Essas crenças são moldadas ao longo do percurso escolar ?
Sim, mas, mesmo quando a criança é nova demais para ter
um histórico, outros preconceitos do professor se manifestam. Alguns acham que
meninas têm dificuldade em matemática, por isso exigem menos delas nessa
disciplina. Outros acham que filhos de pais divorciados se saem pior. Somos
todos cheios de preconceitos e não fazemos por mal, só precisamos tomar
atitudes para impedir que esses preconceitos envenenem o desempenho da classe.
De que forma o professor desestimula os alunos que
considera menos capazes ?
De todas as formas possíveis. Sorrindo menos para
eles, mostrando impaciência, não levando suas dúvidas a sério. Na pesquisa,
gravamos muitas aulas e há um comportamento recorrente : se um aluno tido como
inteligente não entende um assunto, o professor toma aquela dúvida como um
"feedback" do trabalho dele. Pensa em fazer uma revisão da matéria,
por exemplo. Se um estudante considerado difícil tem dúvida, o professor age
como se só ele não tivesse entendido.
|
O senhor diz que treinar o comportamento do docente é
mais eficiente que tentar mudar suas crenças. Fingir que crê no potencial de
alguém é suficiente ?
Fingir é um termo muito forte. Desde os anos 1960 sabemos
que a expectativa dos professores é decisiva no processo de aprendizagem, isso
é senso comum. Acontece que as tentativas de fazer os docentes mudarem suas
expectativas se provaram insuficientes. Nossas crenças não são construídas de
modo racional. Não basta mostrar dados dizendo que meninas são boas em
matemática para que o professor altere seu sistema de crenças.
No fim, descobrimos que ter conceitos bons sobre os
estudantes é muito importante, mas agir corretamente em relação a eles é mais
eficaz.
Como agir bem em relação ao aluno do qual se espera pouco
?
É isso que o treinamento desenvolvido durante minha
pesquisa procura ensinar.
Imagine que acabo de fazer uma pergunta em sala de aula e
um garoto começa a berrar que sabe a resposta. Se sou do tipo que acha que
meninos são bagunceiros, meu impulso será o de controlar aquele começo de
confusão. Vou mandar o aluno sentar no seu lugar e abaixar o tom de voz. Essa
resposta só confirmará o que o garoto já sabe : que o professor o vê como
alguém que atrapalha.
Uma resposta mais adequada seria: "Por que você
não me conta o que acha dessa pergunta ? Enquanto isso, sente-se em seu lugar
para que eu consiga entender melhor".
|
Os pais também influenciam os filhos com suas crenças ...
Certeza. Não posso falar em relação ao Brasil, mas nos Estados Unidos
nós lutamos contra o hábito de certos pais que insistem em fazer trabalhos
escolares pelos filhos. Não sou contra o pai ou a mãe dar um apoio. Mas se faço
o trabalho do meu filho a mensagem é clara : não acredito que ele seja capaz de
dar conta da tarefa.
A conclusão de que a opinião do docente afeta o aluno não
é muito óbvia ?
Ciência não serve só para trazer fatos surpreendentes. Confirmar aquilo de que
já desconfiávamos é tão importante quanto trazer um fato novo.
Demanda
por sucesso é um fardo para os 'melhores da classe', diz educadora
A ideia de treinar professores para que
eles disfarcem sua falta de confiança no potencial de alguns alunos é
contestada por pedagogos brasileiros.
Para Julio Groppa, da Faculdade de
Educação da USP, o estudo do professor americano Rpbert Pianta falha em sua
abordagem excessivamente comportamental. "Não concordo que um
treinamento consiga remodelar o comportamento do docente e fazê-lo agir de um
jeito contrário às suas crenças."
Segundo Groppa, preconceitos do professor
são frutos da época em que ele vive: "É uma coisa muito americana isso de
querer consertar o mundo com ciência, com técnicas".
"Há docentes que tratam seus alunos
como iguais porque verdadeiramente os enxergam assim", diz Patrícia
Magris, do departamento de educação da Uneb (Universidade do Estado da Bahia).
Ela destaca que o excesso de expectativas
não prejudica apenas os estudantes considerados limitados: "A demanda
constante por sucessos acaba sendo um fardo para os alunos rotulados como
'melhores da classe'".
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