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Sexta-feira, 05 de Outubro de 2012
25/06/2012
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PSICOLOGIA SOCIAL
Pesquisadora critica tratamento da LDB a crianças superdotadas
Renata Maia-Pinto
defende aceleração de ensino como estratégia educacional a jovens com altas
habilidades
Luciana Barreto
Da Secretaria de
Comunicação
De origem
humilde, fala suave e gestos gentis, Jean Michel Rodrigues Barros é um garoto
que guarda um distintivo especial em relação a seus pares e colegas: é
superdotado. Com apenas 11 anos, o aluno da rede pública da Ceilândia,
que saltou duas séries e hoje cursa o oitavo ano do Ensino
Fundamental, tem em seu curto percurso escolar uma medalha de bronze conquistada
na Olimpíada Nacional de Astronomia, em 2010. Jean configura um
exemplo de como a aceleração de ensino é uma estratégia bem-sucedida para
acolher crianças, ainda na educação infantil, com essas características. A afirmação
é da pesquisadora Renata Rodrigues Maia-Pinto, que trabalhou, em sua tese de
doutorado no Instituto de Psicologia da UnB, com 12 estudantes superdotados
de escolas públicas do DF, confirmando que essa prática, além de
recomendável, não implica perdas acadêmicas ou dificuldades socioemocionais
às crianças.
Segundo Renata, a
legislação educacional brasileira precisa ser aperfeiçoada para melhor
acolher crianças com altas habilidades. Renata critica,
por exemplo, a proibição de se ingressar no ensino fundamental antes dos seis
anos de idade, referindo-se ao impedimento trazido pela Lei de Diretrizes
Básicas da Educação. Tal restrição, segundo ela, pode repercutir em toda
formação escolar e juvenil, “pois quando mais cedo houver esse encaminhamento
maior será o aproveitamento educacional e melhor a interação com outras
crianças”.
Como outros
pontos fracos da LDB, apontou tanto a falta de regulamentação específica
sobre como incorporar a prática de aceleração de ensino, deixando a escola
vulnerável em relação a que procedimentos implantar, quanto a não previsão de
outras modalidades de progressão no ensino.
Alguns atributos
importantes para caracterizar superdotados são : rapidez e facilidade para
aprender, abstrair ou fazer associações, criatividade, capacidade para
analisar e resolver problemas, independência de pensamento, habilidade
excepcional para talentos variados, como música, artes, dança, informática,
bom relacionamento social e liderança, senso crítico acentuado, sensibilidade
social demasiada, entre outros.
A pedagoga
reconhece, porém, que nem só de glórias e trunfos vivem as crianças prodígio:
“equilibrar altas habilidades e talentos extraordinários com uma
infância proveitosa e feliz é o maior desafio dos gestores de ensino e dos
pais de meninos e meninas superdotados”, acredita. “O Estado,
os pais e a escola devem identificar e reconhecer esses alunos com
características especiais. Caso contrário, há o risco de essas crianças se
mostrarem desinteressadas, desmotivadas, podendo até mesmo apresentar
comportamentos que se confundem com hiperatividade, ou seja, um desastre
anunciado não só para o rendimento escolar como para a vida pessoal desses
jovens”, avalia.
“Podemos citar o
caso do Steve Jobs, inventor da Apple, que, em sua biografia, criticou
abertamente seus professores por não terem acreditado nele, além do Ricardo
Semler, outro empresário bem-sucedido que não foi devidamente estimulado em
sua vida escolar”, complementa.
PRECONCEITOS - Um dos propósitos de seu estudo foi desmistificar o preconceito associado
ao avanço de série como algo negativo, como desajuste socioemocional ou
dificuldade de aprendizagem. Participaram do seu universo de investigação, 12
crianças superdotadas de escolas públicas. Para comprovar sua hipótese de
que a aceleração é uma intervenção bem-sucedida, Renata trabalhou na
caracterização de alunos submetidos a procedimentos de aceleração de ensino
quando freqüentavam a educação infantil, do ponto de vista acadêmico,
cognitivo e socioemocional, bem como na percepção dos próprios estudantes,
seus pais e professores no processo.
“As crianças
superdotadas procuram pares com quem possam compartilhar interesses, visão de
mundo”, atesta a pesquisadora ao defender que esse tipo de convivência
e afinidade é necessário para “uma convivência social mais fácil, pois,
caso contrário, a tendência é destoar daqueles que estão em sua faixa etária”,
complementa.
Segundo Renata, “antigamente havia o estereótipo do nerd,
hoje a realidade é outra. Essas crianças gostam de brincar, mas também de
brincar de estudar”, conta. A partir de sua observação, notou que esses
meninos e meninas brincam de ler e também de inventar jogos. “Para eles, essa
busca pelo conhecimento, por meio de jogos e outras formas de apreensão
criativa, são pura diversão”.
SENSIBILIDADE SOCIAL - Em casa, não dispõe de computador tampouco nunca foi a um cinema.
Os livros também são poucos. Os pais de Jean Michel Rodrigues Barros – ele,
cobrador de ônibus; ela, dona de casa – desconfiaram de sua superdotação
quando o viram lendo sozinho aos três anos de idade. “Não, não ensinamos a
ele”, conta Sandra Rodrigues, mãe de Jean. Orgulhosa, refere-se ao filho como
“computador de dois pés”: “ele sabe tudo. Sempre falo que vou deixar para
fazer minhas compras à tarde porque aí levo meu computador de dois pés para
calcular tudo”.
Aluno já
reconhecido por sua perspicácia e criatividade, Jean se destacou também na
Xlll Olimpíada Brasileira de Astronomia e Astronáutica, em 2010, campeonato
que reuniu quase 800 mil estudantes em todo país, onde foi contemplado com
medalha de bronze.
Com traço maduro
e texto impecável, Jean mostra a revista em quadrinhos que está produzindo. O
gibi é intitulado “anti-bullying”, uma tentativa sua de denunciar uma prática
que considera “covarde, algo que ninguém escapa”, aproveitando para contar
que sofreu bullying pelo fato de ser menor e mais novo que a turma. “Eu
desenho desde sempre. Também aprendi sozinho”, diz, apontando outra
revistinha sua sobre prevenção de acidentes.
Micau Vieira
Santos, professora responsável pela sala de recursos de altas habilidades, da
Escola Classe 64, da Ceilândia, conta que Jean é um garoto de grande
potencial: “criativo, produtivo, com uma sensibilidade social impressionante.
Seu pensamento é muito avançado em relação à sua idade. Acelerá-lo no ensino
foi a melhor alternativa”, avalia. “O superdotado, em geral, quando
acolhido e estimulado, apresenta maturidade emocional e não apenas
cognitiva”, atesta a pedagoga que desde 2003 trabalha com crianças e
jovens com essas características. Jean está sob sua coordenação desde 2008.
De modo tímido e
voz suave, Jean Michel fala de seus jogos e personagens preferidos – Banco
Imobiliário e o Franjinha, do Mauricio de Souza – e também do seu fascínio
pelas estrelas: “o tamanho do universo me assusta e me encanta”. Seus sonhos?
“Conhecer Paris e me formar arquiteto”. “Sim, eu gosto de ser e me saber
superdotado. Tenho mais responsabilidade com o mundo, sei disso, mas fico
feliz de poder, no futuro, ajudar não só o meu pai e a minha mãe, mas também
as pessoas, em geral”, declarou.
Para a autora da
pesquisa, declarações como essa “mostram que se o superdotado não for bem
acolhido a tendência é que incorra em desânimo, desinteresse e até evasão
escolar”. Segundo ela, a partir do que levantou em seu estudo, “as crianças,
quando apoiadas, desenvolvem um autoconceito extremamente positivo”, o que
significa que não apenas se aceitam bem quanto se orgulham de suas
particularidades.
Somente no
Distrito Federal são 43 salas de recursos de altas habilidades, distribuídas
em nove cidades, atendendo a 1800 alunos superdotados. Segundo Renata Maia, o
DF é pioneiro nesse tipo de atendimento: “são mais de 30 anos em um programa
que tem acúmulo e credibilidade”.
RECOMENDAÇÕES – O resultado de seu estudo sugere que as informações que professores dispõem sobre o fenômeno da superdotação e práticas educacionais direcionadas ao aluno com alto potencial ainda são limitadas e, muitas vezes, baseadas em ideias estereotipadas e de senso comum. Ainda se faz necessário, segundo a pesquisadora, um melhor planejamento de estratégias e atividades, a serem desenvolvidas no contexto escolar, considerando-se suas características, interesses, ritmo de aprendizagem e necessidades acadêmicas.
Nesse sentido, em
relação ao trabalho educacional com o aluno superdotado e à adoção da
aceleração de ensino, Renata recomenda tanto que disciplinas sobre
superdotação sejam incluídas em cursos de formação de professores quanto esse
conteúdo seja previsto em programas de educação especial. Também sugere que o
currículo escolar seja flexível, de modo que o professor ofereça atividades
diversificadas para diferentes grupos de alunos, considerando ritmos de
aprendizagem, interesses e habilidades distintos.
Quanto à
legislação educacional, reitera que seja retirada da Lei de Diretrizes
Básicas da Educação a expressão “exceto no primeiro ano de ensino
fundamental”, assegurando, assim, o ingresso da criança nesse nível antes de
completar seis anos, caso se comprove a superdotação. Propõe ainda que a lei
inclua outras modalidades de aceleração de ensino, “para que sejam cumpridos os
direitos constitucionais do aluno de prosseguir nos estudos”.
Renata Rodrigues Maia-Pinto é graduada em Pedagogia Administração
Escolar, Pedagogia Formação de Professor de Pré-Escola e em Pedagogia
Magistério. Mestre pela Universidade de Brasília, em 2012, obteve o título de
doutora, em 2012, no Programa de Pós-Graduação em Processos de Desenvolvimento
Humano e Educação do Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília.
Tese de doutorado: “Aceleração de ensino na educação infantil:
percepção de alunos superdotados, mães e professores".
Programa de Pós-Graduação: Processos de Desenvolvimento Humano e Educação
Unidade Acadêmica: Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília
Orientador: Denise de Souza Fleith
Atualmente Renata
Maia-Pinto está engajada no Conselho Brasileiro para Superdotação. Sua
pesquisa será apresentada, no final de julho, em congresso promovido pela
Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).
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