terça-feira, 4 de outubro de 2011

TALENTO CINESTÉSICO CORPORAL


Depois de passar por turbulência devido à grave lesão no punho, ginasta amadurece, muda o visual e celebra o bom momento dentro e fora do ginásio


http://globoesporte.globo.com/outros-esportes/noticia/2011/09/jade-barbosa-de-menina-fragil-mulher-confiante-em-quatro-anos.html



Aos 20 anos, a doçura ainda está na voz, mas o amadurecimento é evidente. Jade ganhou confiança dentro e fora do ginásio. Trocou a discrição dos cabelos castanhos pelas madeixas alouradas. As unhas e os lábios ganharam cores, assim como a vida. Com o fim da seleção permanente em Curitiba, retornou ao convívio da família e resolveu adotar uma rotina "mais normal". Treina, mas arranja tempo para estudar Desenho Industrial, sair com os amigos e namorar. A receita tem funcionado. No ano passado, após desentendimentos com a Confederação, Jade voltou a competir internacionalmente. Estava ausente desde as Olimpíadas de Pequim-2008 e nervosa, muito nervosa. À toa. Deixou o Mundial de Roterdã com um bronze no salto, que se juntou àquele da edição de 2007, ganho no individual geral.



No mês que vem, a ginasta quer conquistar mais uma medalha num Mundial para a sua coleção, embora prefira falar no coletivo. Em Tóquio, frisa que o objetivo principal será assegurar, com antecedência, a vaga da equipe brasileira nos Jogos Olímpicos de Londres-2012. Mas o sorriso se abre quando o assunto vai para as disputas individuais e vem acompanhado de um "tomara". Jade sabe que tem chances de ir ao pódio. O ouro na etapa de Ghent da Copa do Mundo, em agosto, foi mais um sinal disso. E ela espera que a fase cheia de cores na qual se encontra permaneça não só no visual, mas também na carreira. Com variações de dourados, prateados e bronzeados.





Jade Barbosa nas Olimpíadas em 2008 (Foto: Reuters)

Jade se classificou para três finais nas Olimpíadas de Pequim-2008 (Foto: Reuters)



GLOBOESPORTE.COM: Há quatro anos você se tornou conhecida no Brasil durante o Pan do Rio. Qual a sua maior lembrança daquela competição?


JADE BARBOSA: O que lembro foi do dia em que caí (nas assimétricas) e todo mundo me conheceu porque eu chorei. Voltei para a Vila falando: "Caraca, amanhã tem mais competição. Não acabou". Era uma questão de concentração, eu ainda tinha chance. Era o dia seguinte que valia mais, e fui lá e ganhei uma medalha. Ali provei que basta ter esperança e determinação. Fui reconhecida naquele momento.


Como é voltar a um Pan já consagrada?

É relembrar tudo. Relembrar onde a Jade nasceu para o povo brasileiro. Na verdade, fico muito feliz de poder estar de novo dentro da seleção, do Pan e indo para o Mundial. E no ano que vem, quem sabe, para uma Olimpíada.


O Oleg Ostapenko (ucraniano que comandava a seleção) falava que você tinha tudo para ser a menina dos olhos da ginástica nacional. E hoje é a referência da equipe feminina. Como tem lidado com essa expectativa sobre os ombros?


Quando você entra na competição tem que ser bem egoísta na verdade. É uma palavra bem forte, mas para você representar bem seu país e ser boa para sua equipe tem que fazer seu melhor. E quando entra, tem que fechar tudo e só pensar em você naquela hora, no melhor que vai fazer nos elementos, na série, porque é aquilo que vai valer. Tem que esquecer o que as pessoas em volta estão pensando porque só assim vai conseguir produzir melhor.



Como chegou a esse amadurecimento?

Antes eu fazia ginástica sem pensar, né? Ela saía. E hoje em dia tudo é mais consciente. Sei que posso vencer. Não preciso treinar quinze mil vezes para fazer isso. Sei que se fizer dois bons, vou acertar. E antes não. Antes eu precisava sentir tudo, fazer tudo, estar sempre atenta. A experiência leva a isso, né, a ter consciência da capacidade.

jade barbosa ginástica flamengo (Foto: Ricardo Bufolin/Photo&Grafia)

Ginasta do Flamengo tem lidado bem com o assédio
(Foto: Ricardo Bufolin/Photo&Grafia)




Na sua primeira Olimpíada, quando passou pelos repórteres, você disse aliviada: "Ainda bem que terminou". Hoje olha de forma diferente para aquele dia?


Na verdade as pessoas me maltrataram, acharam feia aquela frase. Mas ninguém sabia o que estava acontecendo. Eu estava morrendo de dor no punho, não sabia o que tinha. Já entrei numa competição sabendo que não ia produzir 100% do que podia. Fazia força e não rendia porque a dor atrapalhava. Estava com muita saudade da minha casa. Passei um tempo morando em Curitiba com aquela seleção e só eu e Deus sabemos o que aconteceu lá. Foi realmente um alívio. Sabia que quando aquele dia acabasse eu ia poder voltar para minha casa e abraçar meu pai sem preocupação. Tanto que não consegui nem aproveitar as Olimpíadas. Hoje vejo que outras meninas estavam naquela mesma situação, querendo que aquilo passasse. E a gente treinou tanto para aquilo para querer que aquele momento passasse... É um pouco estranho.


“ A gente muda, né?

Todo mundo via a Jade criança, novinha.

Mas passaram quatro anos e agora tenho 20”






E agora treinam muito para ir. Com que apetite está para ir pela segunda vez?


Estou muito feliz por ter aguentado até outra Olimpíada. Estar aguentando, porque são poucas as meninas que conseguem fazer dois ciclos olímpicos. O Brasil geralmente tem essa tradição, de as atletas suportarem mais isso. Não é que nem as americanas, que são um pouco mais descartáveis e vão saindo porque tem uma renovação muito grande. Estamos bem felizes de estar melhor este ano. Teve a volta da Daiane (Daiane dos Santos), contamos com a Dani (Daniele Hypolito) e as meninas que estão vindo competiram bem e estão indo para outro Mundial com mais certeza. Acho que estamos nos preparando bem, treinando bastante, e na hora vai dar tudo certo. Deus ajuda a quem trabalha.

jade barbosa ginástica (Foto: Jorge William/Globo)

Jade durante treino da seleção que disputará o Mundial de Tóquio(Foto: Jorge William/Globo)



O que tem feito para diminuir esse nervosismo?

Deixa eu pensar... Tento pensar que já fiz isso várias vezes, que já sei fazer essa série porque já a treinei mil vezes. Que já competi várias vezes. Mas também gosto de escutar música, que seja forte e animada. Falo que tenho um foguinho dentro de mim, né? E esse foguinho é meu aquecimento. Quando estou bem aquecida, dá certo. E a música me deixa animada para aquecer. Por isso, fico correndo de um lado para o outro.

Fisicamente seu visual é mais agressivo e o olhar já não é mais o mesmo. Parecem refletir a firmeza que você ganhou...


É. A gente muda, né? Todo mundo via a Jade criança, novinha. Mas passaram quatro anos e agora tenho 20. Já faço faculdade. Naquele tempo da seleção a gente vivia para a ginástica. Até a escola era dentro do ginásio. Hoje não. A gente já tem uma vida, nossos amigos normais. Até minha fisioterapia não é no ginásio, como era lá. A gente tem uma vida social muito mais aberta. E isso ajuda a amadurecer também.


Se inspirou em alguma famosa para mudar o estilo?

Aqui no Rio todo mundo começou a pintar o cabelo e aí pensei que nunca tinha feito nada com o meu. Aí comecei a pintar. E a equipe do Flamengo ficou toda loura, menos a Dani (Daniele Hypolito). Se sou meio camaleão ? É, então. Tenho batom de tudo quanto é cor: rosa, laranja, azul. E as meninas já se acostumaram. Porque estou sempre colorida, sempre com o olho pintado.


O que ainda há em você daquela menina de 16 anos que apareceu para a ginástica?

Tem, né ? Eu choro até hoje, cara. Não tem como (risos). Acho que minha expressão é quase a mesma, sempre fico um pouco mais fechada. Ninguém sabe se vou chorar ou ficar feliz. Acho que é a minha maneira de concentrar na hora. Acho que isso é igual.


Mas você passou a atrair olhares não só por sua ginástica, mas também por ser uma menina bonita. Como lida com esse tipo de assédio? Algum fã já foi mais ousado?




Já teve. Estava competindo no Mato Grosso do Sul. Aí uma menina, uma menina!, gritou assim para mim da arquibancada: "Jade, não sei o que".




Olhei mas não tinha escutado o que tinha falado. E ela chegou mais perto e disse: "Jade, me dá um selinho?" Eu: "O quê? Não acredito!" (risos). E ela falou que era um só! Nossa, fiquei sem graça, com muita vergonha. Não sabia aonde enfiar minha cara. Tem fã que é meio maluco, mas tem gente legal. Uma vez ganhei um CD com o filme do Harry Potter que o garoto fez a dublagem. Eu adorava Harry Potter, sabia todos os filmes. E aí, na parte em que o personagem beijava uma japonesinha ele botou: "Jade, nessa hora eu pensava em você". Gente, como é que pode, né? (risos). Tem gente que agarra... Você tem que saber, né...



Antes adorava Harry Potter, atualmente adora o quê?



Hoje é mais diferente. Gosto muito mais de estar na rua com os meus amigos. Só para sentar num restaurante e conversar ou ir à praia. Gosto muito de praia, assim como de desenhar também. Não assisto mais filmes, estou em outros lugares (risos). Antes eu chegava em casa e assistia vídeo de ginástica em casa. Agora não consigo fazer mais isso. Não saía da internet só vendo ginástica.


Já recebeu algum convite para fazer fotos sensuais ou posar nua?



Não, pelo menos não chegou a mim. Acho que tem momento para fazer as coisas. Agora não é momento certo para isso porque estou treinando. Mas não sei se um dia faria... No momento não é o que eu preciso. Não sei como reagiria se chegassem para mim e pedisse para autografar uma foto assim. Não sei (risos).



Jade Barbosa lança grife de roupas esportivas (Foto: Reprodução)



Nos tempos de seleção permanente namorar era praticamente impossível. Como é ter essa liberdade agora?

Era praticamente proibido lá. Acho que antes não fazia tanta falta porque a gente tinha uma rotina que era só ginástica. Hoje a gente tem mais acesso e tudo é mais natural. E é necessário às vezes. Como você vai viver só para isso aqui? Não tem como. A pessoa não aguenta. Tanto, que faço terapia, treinamento funcional que antes não podia. Tudo o que posso fazer para melhorar, eu faço. Se eu tiver que sair para dançar porque vai me fazer bem, aviso ao meu técnico. A ginástica eu já sei fazer. Tenho que estar bem como pessoa.

Seu pai é uma fera com seus namorados?

Não (risos). Meu pai prefere que eu esteja namorando do que só ficando. É complicado você não ter namorado dentro do esporte porque não entende a rotina.

Os rapazes costumam ter medo de abordar você?

As pessoas têm um pouco de vergonha mesmo. Talvez de eu falar: "Não! Sai daqui". Mas sou normal. Um pouco tímida, mas normal. Chego numa festa e falo com todo mundo, danço. Sou sociável.

Na faculdade, o fato de ser uma atleta famosa gera uma colaboração dos colegas de turma ou um ciuminho?

Você tem que procurar pessoas que vão te acrescentar em qualquer lugar. E lá eu me junto àquelas que possam me ajudar. Não sou daquelas que não faz trabalho. Só tenho limitação para algumas coisas. Eles me passam a parte mais prática. Prefiro desenhar do que escrever. Escrever leva muito mais tempo.

Como está seu planejamento para quando encerrar a carreira? Já definiu em que área quer seguir?

Até 2016 é certo que quero continuar na ginástica. Certo. Tenho muito ainda a acrescentar à seleção. Tem o meu Instituto, que a gente está procurando recursos ainda. É uma coisa que gosto bastante, de trabalho social, porque já cansei de ver talento desperdiçado. E também tem a parte da faculdade, com essa linha de roupas. Mas não sei... Penso também em ir para o circo (Cirque du Soleil), mas para trabalhar na parte de montagem.

Quanto tempo você dedica à grife de roupas que lançou no seu site?

Na verdade é tudo feito em família. Eu e meu pai funcionamos bem juntos. Meu pai desenhava os collants da seleção antes. A gente faz tudo em casa. Desenha e vai buscar material. Gosto dessa parte. Fazer Desenho Industrial ajuda bastante. Gosto muito de moda.

É estranho ser, com 20 anos, uma veterana?

No Brasil é uma coisa natural. Acho que tenho coisas boas para passar, vejo que ajudo. Tanto que no Mundial anterior eu passei bastante coisas boas para as meninas. Porque quando fico nervosa começo a falar para ajudar as outras pessoas. É a melhor coisa que faço. Como tinha ido para o Mundial e fiquei tanto tempo sem competir, a última tinha sido a Olimpíada, então eu estava bem nervosa. Estava com uma expectativa grande para acontecer logo a competição porque a semana antes é terrível, não chega nunca. Falava para elas no dia: "Vamos, que vai dar tudo certo. Vamos, que a gente tem que provar". Acabou que a competição foi superboa (ganhou o bronze no salto).

Naquele período de tantas incertezas, em que pensou em parar por causa do sério problema no punho, houve alguma história de algum atleta ou algo que você leu que ajudou a dar coragem para seguir em frente?

Muitas pessoas mandaram histórias para o meu site contando histórias de vida. Gente que sofreu acidente de carro, bailarina... Um monte de histórias diferentes, mas onde todas conseguiram se dar bem no final e sem cirurgia. Acho que isso que me levou mesmo a não operar, a continuar.

Você não quer que um filho sofra o que você sofreu.

Por mais que isso aqui seja o que eu mais amo na minha vida"


As dores deram uma trégua?

Tenho dor quando passo muito do meu limite. Em competição, que todo dia é no solo duro, ele dói um pouco. Então eu tenho que descansar um pouco, fico só fazendo trabalho de perna durante três ou quatro dias, e já está normal de novo.

Se tiver um filho gostaria que ele fizesse ginástica?


Complicada essa pergunta. Acho que não forçaria nada. Se me pedisse para fazer eu deixaria, mas de falar "vamos lá fazer", acho que não... Você não quer que um filho sofra o que você sofreu. Por mais que isso aqui seja o que eu mais amo na minha vida. Tem que partir da pessoa. O meu irmão eu não consegui convencer do contrário.

O que espera para os Jogos de Londres-2012?

Uma Jade mais feliz do que em 2008. O que já está de bom tamanho, porque a ginástica já está no sangue, né? É só treinar. E acho que a felicidade conta muito para um bom resultado. É isso (sorri).

Se eu tiver que sair para dançar porque vai me fazer bem, aviso ao meu técnico. A ginástica eu já sei fazer.

Tenho que estar bem como pessoa"

Um comentário:

  1. Certamente vai aparecer mais ginastas brasileiros talentosos que seguirão os exemplos de DAIANE DOS SANTOS, JADE BARBOSA e de outros et ceteras futuramente, ao longo dos anos, na maioria das veses, SUPERDOTADOS, e não pode negá-los, porque são filhos de Deus, e Deus os quis assim!!!

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