sábado, 19 de maio de 2012

História de um superdotado que não foi identificado e os prejuízos da falta de identificação da superdotação







Recebi este e-mail de um leitor meu, que se apresentou como um superdotado, que não foi identificado. Reparem como, no e-mail, ele denota uma certa frustração gerada pela falta de identificação de sua condição de superdotado ; a falta de estímulo deste potencial e como a falta de motivação prejudicou a sua vida. Ele concordou e me deu autorização para trazer o e-mail que ele me mandou, aqui, pois entende que, desta forma, pode estar ajudando futuras crianças superdotadas que não tenham ainda sido identificadas ou pais que se neguem a identificar os seus filhos como tal. * O nome e opção de estudo foram trocados para preservação do autor do e-mail.




“Olá,




Encontrei seu blog enquanto pesquisava sobre o assunto de altas habilidades. Meu nome é P., tenho 20 e poucos anos e sou "superdotado". Porém jamais recebi qualquer tipo de tratamento especial. O efeito disso foi que desde minha primeira série do antigo primeiro grau, até meu último ano no ensino médio, eu sempre fui visto como uma espécie de "aberração" por meus colegas de classe. Porém eu não queria isso. Logo, comecei a "negar a mim mesmo", fui perdendo gradualmente meu interesse nos estudos, e quando cheguei no último ano do ensino médio, no ano de 2001, minhas notas eram apenas suficientes para passar. Isso porque eu me "esforçava" apenas para isso. E por "esforçava" eu quero dizer chegava na sala de aula e encontrava meus colegas apavorados porque haveria uma prova (que eu nem tinha idéia sobre a existência pois não prestava atenção às aulas), então eu pegava o caderno de alguém emprestado (porque o meu ficou vazio durante o ensino médio, só precisei de um que terminou apenas com algumas poucas coisas escritas) e "estudava" nos minutos antes do/a professor/a chegar. Pronto, tinha a nota necessária para passar.  Apesar disso, meu professor de matemática viu meu potencial, me convidou para participar de competições de matemática, nas quais fui campeão diversas vezes, o que no fim das contas ajudou apenas a fixar ainda mais minha imagem de "crânio", "nerd", "super inteligente", etc...
Pois bem, esse costume de não estudar me custou caro. Ao ingressar no curso superior em ciência da computação da Universidade Federal de Santa Maria, RS, eu não possuía as ferramentas necessárias para as disciplinas de matemática, pois como falei, apenas "estudava" minutos antes das provas, e "jogava fora" aquele conhecimento assim que a prova estava terminada. E o pior : não tinha (e ainda não tenho) o costume de estudar, então acabei não procurando o material necessário. Ainda assim, nas disciplinas em que apenas a lógica era necessária como programação de computadores, inglês (que aprendi sozinho enquanto ainda criança), introdução à computação, e outras similares, não tinha nenhuma dificuldade. Na verdade até mesmo achava elas chatas, pois tudo aquilo era extremamente simplório e inútil para mim, pois já sabia 99% do que era ensinado, e o que não sabia eu aprendia na primeira explicação. Logo perdi o interesse, e semestre após semestre eu me matriculava e acabava desistindo de frequentar as aulas. 




Algumas pessoas, incluindo professores, disseram que haveriam disciplinas mais difíceis em semestres mais avançados do curso. Me matriculei nas "difíceis". Não eram !



Ainda fiz vestibular para um curso na área de exatas, passei em 2º lugar (sem estudar), e cursei ambos os cursos concomitantemente por alguns poucos semestres. Quantidade maior de chatisse não muda o fato de algo ser chato. Abandonei ambos.




Pois bem, desculpa a grande quantidade de texto, apenas escrevi tudo isso porque nunca tive ninguém que fosse capaz de compreender minha situação, e acabei utilizando a senhora como meu "muro das lamentações". Teria muito mais para escrever, mas acredito que isso já é suficiente para que a senhora entenda minha história.




Poucos dias atrás descobri com a ajuda da minha namorada, que é professora, a existência de uma educadora especial, professora aqui da mesma universidade e que lida exatamente com altas habilidades. Porém no site de seu grupo de pesquisas, ela fala apenas em crianças com altas habilidades. Mas como lí na LDB e em seu blog, existe a possibilidade de aceleração dos estudos quando o aluno apresentar alto desempenho acadêmico. Mas eu não possuo alto desempenho. Muito pelo contrário, como deves imaginar meu desempenho é péssimo, tendo em vista que desisto das disciplinas por me sentir entediado logo nas primeiras semanas.




Fico triste em ver que meus antigos colegas de uma das faculdades que cursei, que eu muitas vezes socorria nos momentos de "desespero", hoje possuem título de Mestre e alguns estão próximos do título de doutorado. Eu estou aqui, retornei ao meu curso de ciências exatas, esse semestre, mas já estou reprovado por (falta de) frequência.




O objetivo dessa mensagem é na verdade fazer algumas perguntas.




Estou muito velho para tentar uma aceleração dos meus estudos? (Lembrando, mais de 25 anos).




Mesmo que eu consiga comprovar minhas "altas habilidades", isso me ajudaria a terminar o curso de alguma forma que não seja presencial? Definitivamente não tenho paciência para assistir aulas. Se dependesse de mim estaria fazendo pesquisa de ponta. O conhecimento do curso já está nos livros que em alguns minutos eu posso ler e compreender suficientemente para realizar tarefas que dele dependam.




Li em seu blog sobre a obtenção de créditos por provas. Considero que isso signifique que poderia apenas realizar provas ao invés de frequentar um semestre inteiro de aulas. Estou certo? Porém a LDB fala apenas em "Os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos" (Art 47º,  § 2º).




Irei procurar a educadora especial para maiores informações, mas gostaria que se possível a senhora me passasse informações ou pelo menos respostas para as perguntas acima.



Agradeço antecipadamente,



Respostas :



1  1)     Estou muito velho para tentar uma aceleração dos meus estudos? (Lembrando, 27 anos, 28 no próximo mês).


Resposta : Não. Você não está velho, mas para que possa se beneficiar da aceleração de estudos, também em nível universitário, você terá que preencher  alguns requisitos legais, previstos no artigo 47 da nossa Lei de Diretrizes Básicas da Educação (LDB), abaixo transcrito :




 “Art. 47. Na educação superior,  (...).




§ 2º Os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos, demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino.



Como você observa do texto legal, para que você possa se beneficiar da abreviação de seu curso, em nível universitário, térpa que comprovar o seu extraordinário aproveitamento nos estudos. Veja que o legislador te dá uma pista de como você poderá comprovar o seu extraordinário aproveitamento : demonstrado por meio de provas e outros instrumentos de avaliação específicos, aplicados por banca examinadora especial, poderão ter abreviada a duração dos seus cursos, de acordo com as normas dos sistemas de ensino.




Então, eu acho que, se você quiser tentar a aceleração de série, em nível universitário, sugiro que você, providencie um laudo, atestando a sua superdotação. Vc não mencionou de qual estado é. Suponho que você seja do Rio de Janeiro e que esteja se referindo á Professora Cristina Delou. Mas, gostaria de saber de qual estado você é, aonde estuda e quem é esta especialista a que você se referiu, no meu e-mail.




Acho que o laudo ajudará a embasar o que você irá pedir (abreviação do seu curso universitário), no seu requerimento, a ser feito, por escrito, para a universidade em que você estuda. Nele, você deverá mencionar os artigos 47 e 59 da LDB, bem como os artigos 205, 206 e 208, inciso V, da Constituição Federal, abaixo também descritos. Mas, não escapará de fazer a prova e nem da avaliação a ser feita por outros instrumentos específicos, que será aplicada por uma banca examinadora especial. E, mesmo assim, seu pedido terá que estar previsto no Regulamento ou Regimento Interno da universidade “(...) de acordo com as normas dos sistemas de ensino”.




Caso o seu pedido de aceleração de curso universitário seja negado, sugiro que você ingresse com Mandado de Segurança para conseguir uma liminar e abreviar o seu curso com a ordem judicial.




“Art. 59 da LDB. Os sistemas de ensino assegurarão aos educandos com necessidades especiais:


(...)



II – (...) e aceleração para concluir em menor tempo o programa escolar para os superdotados ;



Constituição Federal de 1988 :




Diz o artigo 205 da Constituição Federal de 1988: " A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho"




Art. 206. “O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios :




I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola ;



II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a arte e o saber;



Art. 208. O dever do Estado com a educação será efetivado mediante a garantia de :



V - acesso aos níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da criação artística, segundo a capacidade de cada um ;




2) Mesmo que eu consiga comprovar minhas "altas habilidades", isso me ajudaria a terminar o curso de alguma forma que não seja presencial ?



Resposta : O que você irá conseguir é reduzir, abreviar a duração de seus estudos, o que , por si só, já lhe permitirá menos frequencia na universidade. Porém, entendo que isto não quer dizer que você possa terminar o seu curso, de uma forma que não seja a presencial, tendo em vista o disposto no parágrafo segundo do artigo 47 supra. A não ser que o seu curso seja a distância (talvez esta seja a hipótese que melhor se encaixe em seus perfil e características...



“Artigo 47



§ 3º É obrigatória a freqüência de alunos e professores, salvo nos programas de educação a distância.




3) Li em seu blog sobre a obtenção de créditos por provas. Considero que isso signifique que poderia apenas realizar provas ao invés de frequentar um semestre inteiro de aulas. Estou certo ? Porém a LDB fala apenas em "Os alunos que tenham extraordinário aproveitamento nos estudos" (Art 47º,  § 2º).



Resposta : O que você irá conseguir é reduzir, abreviar a duração de seus estudos, o que , por si só, já lhe permitirá menos frequencia na universidade, mas não deixar de frequentar a série seguinte, caso você consiga abreviar o seu curso. Porém, entendo que isto não quer dizer que você possa terminar o seu curso, de uma forma que não seja a presencial, tendo em vista o disposto no parágrafo segundo do artigo 47 supra. A não ser que o seu curso seja a distância (talvez esta seja a hipótese que melhor se encaixe em seus perfil e características.




A educação inclusiva no ensino superior é direito fundamental da pessoa humana, atendidos os requisitos de mérito e capacidade, e se dá mediante a implementação, por parte do Poder Público competente, de uma série de medidas quantitativas e qualitativas  na educação para evitar a exclusão de minorias, dentre as quais as pessoas portadoras de  deficiência e os superdotados.

3 comentários:

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  2. olha eu tambem sou superdotado e me indentifiquei um pouco com esse cara, porem sou contra ele em alguns pontos.
    poxa n e so pelo fato de ser superdotado que as pessoas tem que te salva. a gente tem que ter noção do que e certo e errado, sei que as vezes e uma tortura mas nos temos que aprender coisas que não gostamos superdotados ou não, lembre_se que vc esta inserido em uma sociedade e essa tem regras mesmo que não sejam seguidas as vezes, infelizmente nem todos tem a oportunidade de ter uma educação especial.
    eu por exemplo não tive essa oportunidade nas senpre corri atras de aprender as coisas que eu considero necessarias para desenvolvimento fulturo não basta ser so superinteligente tem que ter garra, acho que esses problemas acima descritos tem mais aver com diciplina do que com a superdotação em si.
    e outra manda esse cara procurar um bom pisicologo nulher de preferencia pois esta tem uma sencibilidade maior, pois nesse processo de "negar a si mesmo" pode ter desenvolvido uma serie de problemas pisicologicos, e outra coisa niguem vai se dar bem so porque e superdotado, tem ter garra ir a luta ser original cuidar de si mesmo ser feliz mesmo sendo diferente dos outros, e para de colocar a culpa nas pessoas o unico culpado de seu desenpenho e você mesmo.
    boa sorte meu nome e julio cesar, tenho 19 anos sou superdotado e não tenho vergonha disso. e nem espero piedade de ninguem

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  3. Eu vivo problemas muito parecidos. As dificuldade foram ficando realmente preocupantes no fim do ensino fundamental e início do ensino médio. Vieram "do nada" uma forte depressão, rejeição à escola e certa rebeldia, e por isso parei meus estudos por dois anos. Voltei e continuei com muita dificuldade de permanecer naquele lugar, até me formar. Junto a isso, foi sendo crescente a diferença de pensamentos (gostos, assuntos, conhecimentos gerais, profundidade e alcance de raciocínio, etc) em relação aos demais da minha idade e também de pessoas mais velhas. Me senti indo cada vez mais distante do senso comum (hoje o sinto quase ausente). Me ingressei na universidade, num curso de Psicologia, mas como em pouquíssimo tempo eu já estava muito mais avançado que o normal (o que em tese seria bom), acabei largando o curso por achar o sistema de ensino muito fácil e amotivacional, e também pela má interação social (problema que nessa época já havia aumentado bastante, se tornando uma grande fobia social), já que, além da convivência básica com os colegas, eu necessitava destas interações para realizar inúmeros trabalhos (que a maioria dos professores não permitia que eu realizasse sozinho, o que limitava minhas capacidades à dos outros alunos e me desanimava bastante). No ano seguinte retomei os estudos no mesmo curso, em outra universidade, mas o resultado foi o mesmo (um pouco pior). Em nenhuma das duas universidades obtive reconhecimento e principalmente o apoio do corpo docente. Cheguei até a procurar a coordenação para uma possível solução, mesmo que parcial, mas obtive um tratamento negligente e indiferente. Fico muito triste por não ter assuntos "normais" com as pessoas. Me limito a ficar quieto, no meu canto, e ansioso quando tenho que realizar atividades (que julgo até infantis) com as pessoas da sala.
    Eu tenho muitos problemas emocionais, em partes devido a este problema, em partes a outros. Em relação a ser "superdotado", é um problema (sim, pelo menos no meu caso, julgo como um grave problema) que eu não comento com ninguém, pois ninguém vai entender. E pior: serei julgado de arrogante (julgamento muito comum), e isso é uma coisa que não sou.
    Ao meu ver, o maior problema do superdotado é se adaptar na sociedade. Querendo ou não, a sociedade sempre seguiu esses moldes, essas limitações, e ela não está errada. O superdotado também não está errado. Mas como se adaptar? O superdotado, em momento de interação com a sociedade, pode baixar seu nível intelectual para haver comunicação recíproca (o que eu acho ao mesmo tempo uma habilidade admirável e um esforço desgastante). O problema é que essa limitação forçada (ser o que não é) pode possibilitar uma melhor comunicação, mas tornará a interação desagradável e provocará reações emocionais negativas. E se ele resolver a não se limitar, a comunicação com a sociedade se torna limitada e improdutiva, e também provocará reações emocionais negativas, já que estar à margem da sociedade nunca é saudável, não só para o superdotado como para os mais diversos tipos de pessoas nessa condição. Ou seja: a incognita da adaptação do superdotado muito dificilmente será exposta, pois as soluções envolvendo indivíduo-sociedade se contradizem e se contrapõem.
    Procurei algo relacionado na internet, achei esse texto, e me resta comentar isso aqui, sem me identificar, sem nem conhecer esse lugar e nem saber se alguém vai ler. Mais como um simples desabafo, ou auto-desabafo. =)

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