Extraído do site : http://ultimosegundo.ig.com.br/educacao/estamos-desperdicando-talentos-diz-especialista-em-superdotados/n1597689953678.html
“Estamos
desperdiçando talentos”, diz especialista em superdotados
Psicóloga alerta que muitas crianças com altas
habilidades são diagnosticadas erroneamente. Estudantes precisam de atenção
especial
Marina Morena Costa, iG São Paulo | 12/03/2012 11:11
Cristina Paulino Colavite cresceu vendo a mãe, professora de escola
pública, quebrar a cabeça para estimular os alunos mais inteligentes de suas
turmas. “Ela contava que alguns aprendiam mais rápido do que outros e sentia
que precisava oferecer algo a mais a eles”, lembra. E por que alguns alunos
aprendiam mais rápido do que outros? Em busca da resposta e fascinada pelos
diferentes níveis e graus de aprendizagem dos seres humanos, Cristina resolveu
se especializar em crianças com altas habilidades, os superdotados.
Psicóloga com pós-graduação em Psicologia Clínica, especializada em
Educação Especial para alunos com capacidade acima da média, ela atuou na
educação básica durante 20 anos. “Na minha concepção, deveria haver professores
e psicólogos nas escolas. Educar significa dar amparo emocional também”,
afirma.
Cristina Colavite, psicóloga especialista em alunos com altas habilidades
Apesar de terem o rótulo de “gênias” e “superhomem”, Cristina destaca que
as crianças superdotadas são em geral incompreendidas e sofrem. Muitas recebem
diagnóstico errado de hiperatividade, déficit de atenção e são medicadas sem
necessidade. Para orientar professores a trabalhar com esses alunos em sala de
aula, Cristina dará um curso a partir do dia 15 de março no Sindicato dos
Professores de São Paulo (Sinpro-SP).
Hoje, Cristina é membro do Conselho Brasileiro para
Superdotação (CONBRASD), da Associação Brasileira para Altas
Habilidades/superdotação (ABAHSD) e atende crianças, jovens e adultos em uma clínica
particular . “Tenho recebido muitos pacientes com diagnóstico errado de
hiperatividade e TDA (Transtorno do Déficit de Atenção). Crianças que estão
tomando Ritalina aos 8 anos de idade, sem necessidade”, alerta.
Leia a entrevista concedida ao iG:
iG: Como identificar
a criança com superdotação? A quais sinais os pais e professores devem estar
atentos ?
Cristina Colavite: É muito complexo, porque são crianças heterogêneas. Geralmente elas têm uma facilidade muito grande de aprendizado em diversas áreas do conhecimento, profundidade na percepção de mundo, nas sensações, nas observações, nos detalhes e um senso de justiça, ética e moral muito aguçado. São crianças que ficam indignadas com a injustiça e têm uma necessidade absurda de conhecimento, de desafio. Tem facilidade para fazer analogias, associar desde muito cedo o que veem, leem e ouvem. A memória é maravilhosa e elas conseguem organizar as informações. Uma criança comum passa por um menino de rua passando fome e repara. Mas, se logo na sequência há uma vitrine de brinquedos, ela esquece o menino. O superdotado não, ele quer saber por que a criança está lá, quem vai cuidar dela, se ela vai à escola, se ela tem família, e não para de fazer perguntas. Eles se envolvem com os assuntos.
Na sala de aula, elas acabam ficando com rótulos negativos. Porque o que o professor fala, para elas não é o suficiente e às vezes completamente banal. Então elas não prestam atenção e fazem bagunça, ou se fecham no seu mundo interno.
São crianças desde muito cedo
incompreendidas.
Esses sintomas podem
ser confundidos com distúrbios emocionais?
Cristina Colavite: Sim. Erroneamente muitas crianças com altas habilidades são classificadas ou como apáticas, ou hiperativas e déficit de atenção. Elas sofrem e ficam com uma sensação de impotência fora do comum diante das injustiças, dos problemas sociais e políticos do País, por exemplo. Se não são orientadas, se fecham em uma redoma e muitas vezes não conseguem lidar com a frustração. Seu desenvolvimento cognitivo não é compatível com seu desenvolvimento emocional. Os superdotados têm ideais e profundidade no fazer acontecer, mas muitas vezes acabam sendo desestimulados pelos pais e professores, que dizem coisas do tipo “isso não é para a sua idade”, “quando você ficar mais velho vai entender”, “chega de tantas perguntas”, etc. Tenho recebido muitas crianças com diagnóstico errado de hiperatividade e TDA (Transtorno do Déficit de Atenção), que estão tomando Ritalina aos 8 anos de idade.
Como eles devem ser
tratados na escola?
Cristina Colavite: Não se deve segregar. Eles devem conviver com as diferenças e devem ser geradas oportunidades para que eles encontrem seus pares. O ideal é ter um espaço extraclasse, com profissionais capacitados, no qual eles possam ter acesso a tudo o que necessitam para seu desenvolvimento pleno, inclusive cursos. Na minha concepção, deveria haver professores e psicólogos nas escolas. Educar significa dar amparo emocional também. O ideal é ter essa parceria, porque os psicólogos vão orientar como as crianças lidam com a aquisição do conhecimento, como se relacionam enquanto os professores vão transmitindo o conhecimento.
Mas são poucas
escolas com esses profissionais. O que os professores podem fazer para
estimular esses alunos?
Estima-se que 5% a
10% da população seja superdotada. Isso significa que em praticamente toda
classe há cerca de dois alunos superdotados. Estamos desperdiçando talentos?
Cristina Colavite: A Organização Mundial de Saúde fala em 12% da população. Eu
acho que este índice varia de 5 a 8% e acredito que em cada sala a gente tenha
pelo menos um estudante com alta habilidade perceptível. Sem dúvida, estamos
deixando de despertar nossos melhores políticos, administradores, matemáticos,
cientistas, artistas, pesquisadores.
Os superdotados tem
um perfil emocional distinto? São tímidos, sofrem bullying, tem problemas
emocionais, dificuldades de expressão ou isso varia muito de criança para
criança ?
Cristina Colavite: Depende de cada criança. A maturidade significa desenvolver os recursos internos emocionais para lidar com as situações adversas do mundo. A criança não sabe fazer isso. Mediante a uma percepção de mundo muito aguçada, o desenvolvimento emocional estará sempre aquém. O desenvolvimento emocional tem que estar muito bem amparado para segurar essa percepção de mundo intensa. Educadores e pais têm que ouvir a criança, entender a demanda dela e não minar. Tentar entender suas necessidades. Olhar para a criança sem preconceito, sem a ideia de que todas são iguais. E procurar supri-las.
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