sábado, 30 de novembro de 2013

Videogames para a atenção

suzana herculano-houzel





Muita gente fala mal da tecnologia e levanta até a possibilidade de o deficit de atenção de tantas crianças e jovens adultos ser causado pelo uso dos aparelhos modernos, que permitem (ou exigem) que a atenção seja dividida entre várias tarefas ao mesmo tempo. Eu discordo e, continuando minha campanha em prol da tecnologia (e contra, isso sim, seu mau uso), digo o porquê: a melhor coisa que pode acontecer para melhorar a capacidade de atenção do cérebro é justamente exigir dela.


A neurociência aprendeu isso com uma das invenções tecnológicas mais execradas nos círculos pseudocientíficos: o videogame. Primeiro, descobriu-se que ficar horas a fio na frente do monitor não faz mal algum à visão. Pelo contrário, a acuidade visual até melhora em alguns jogadores.


Segundo, jogadores de videogames de ação, como Grand Theft Auto, Medal of Honor ou Call of Duty, têm uma capacidade maior do que não jogadores de não se deixar distrair por objetos fora do foco de atenção, ao mesmo tempo em que conseguem detectar objetos interessantes na periferia do campo de visão. Ou seja: têm maior capacidade de atenção.


Há que ser cético, contudo, e lembrar que talvez seja justamente uma maior capacidade prévia de atenção de alguns jovens que faça com que eles se dediquem muito mais do que os outros aos videogames de ação --atividade que seria naturalmente mais fácil para eles, nesse caso. Mas é fácil tirar a dúvida: basta treinar jovens não jogadores e medir sua capacidade de atenção antes e depois da prática.


Resultado: tanto moças quanto rapazes que passam a jogar Medal of Honor diariamente, por exemplo, demonstram melhora na coordenação visuomotora, na capacidade de detectar objetos e na atenção, com apenas dez dias de treino. Jogar o bem-comportado Tetris, em comparação, não adianta nada. A atenção melhora... quando se presta atenção --assim como a memória melhora quanto mais recorremos a ela.


É claro que jogar videogames pode trazer problemas. Assim como beber água em excesso faz mal (sabia?), jogar demais pode ser nocivo, principalmente para jovens e crianças com predisposição a comportamento impulsivo --e, antes de mais nada, por tomar o tempo em que eles poderiam estar aprendendo outras coisas. Mas, de novo, o problema não é da tecnologia: é do mau uso que fazemos dela.


Suzana Herculano-Houzel, carioca, é neurocientista treinada nos Estados Unidos, França e Alemanha, e professora da UFRJ. Escreve às terças, a cada 15 dias, na versão impressa de "Equilíbrio".


suzana herculano-houzel


Nenhum comentário:

Postar um comentário