quinta-feira, 6 de setembro de 2012

A ATUAÇÃO DA PSICOPEDAGOGIA NO TRABALHO COM FAMÍLIAS COM CRIANÇAS E ADOLESCENTES COM TALENTOS EXCEPCIONAIS




 

Maria Cecília Castro Gasparian






Antes de responder suas perguntas quero dizer que quando falamos de crianças e adolescentes com talentos especiais, ou superdotados, estamos entrando no campo da complexidade e dos grandes desafios. Os estudos sobre essas características ainda são incipientes e pouco conclusivos. Os testes de QI eram e continuam sendo ainda os mais usados, porém eles, atualmente, apenas nos dão pistas sobre esses indivíduos e tem provado que pouco podem ajudar estes indivíduos a terem sucesso nas suas atividades, principalmente quando adultos. Ser superdotado não é passaporte para o sucesso, muito pelo contrário, as pessoas que assim são, sofrem por não compreenderem os outros e a si mesmas, com isso são discriminadas na escola, no trabalho, são perseguidas, excluídas, são invejadas e constantemente testadas, exploradas e mal entendidas. Sofrem frequentemente de ansiedade, angustia e depressão e se isolam tornando-se o “anti-social” da turma e mais tarde da sociedade. Os pesquisadores neste campo estão estudando as diversas formas de como isso ocorre e as suas inúmeras manifestações e nuances, porém pesquisam-se apenas as pessoas com níveis intelectuais e cognitivos acima da média e as crianças e adolescentes que demonstram altas sensibilidades espirituais? Essas, então, nem são pesquisadas porque a Ciência atual ainda não tem instrumentos para verificação e observação. São crianças e adolescentes que estão um passo além de seu tempo. A questão ética e moral, sempre questionada por eles são constantemente ignoradas pelos adultos. Temos que, como Psicopedagogos, estarmos atentos a essas crianças e só um olhar diferenciado poderá auxiliá-las a conviver com seus atributos.


 


Quais diferenças na prática psicopedagógica são adotadas no trabalho com famílias com crianças e adolescentes com talentos excepcionais?



Começo respondendo sua pergunta com uma orientação de Maude Mannoni que diz que “os pais inconscientemente deixam a seu filho a carga de refazer sua história, mas refazê-la de tal maneira que nada deveria mudar, apesar de tudo. O paradoxo em que a criança está presa produz logo efeitos violentos; com efeito, raramente há oportunidade de que a criança se realize em seu próprio nome”.  Tenho observado ao longo de minha prática psicopedagógica, o desejo dos pais na vocação artística do filho visando mais o seu próprio sonho a ser realizado do que o próprio filho desenvolver sua aptidão ou sua vocação seja qual for. Essa afirmação serve para todas as famílias com crianças e adolescentes que apresentem algum talento fora dos padrões normais, assim como para as famílias que apresentem alguma forma de sofrimento, seja ele qual for, seja qual for o motivo.


Quais são as queixas mais comuns dessas famílias e do indivíduo superdotado?


As queixas mais frequentes das famílias são: rebeldia, auto-independência, arrogância, enfrentam e questionam tudo, falta de limite prejudicando suas atividades em classe. Por outro lado as queixas do indivíduo superdotado são: a falta de amigos, a escola e as aulas são aborrecidas, apresentam com freqüência quadro de depressão, isolamento. As queixas diferem muito de família para família e de indivíduo para indivíduo.



Como as famílias lidam com a criança portadora de talentos excepcionais?


Como essas crianças (chamadas de precoce) apresentam habilidades superiores à sua idade, num primeiro momento os pais sentem orgulho e estimulam cada vez mais essas habilidades, mas com o passar do tempo isso começa a incomodar, prejudicando o desenvolvimento integral da criança. Muitas crianças, por exemplo, diagnosticadas como portadoras de TDAH são crianças talentosas que não tiveram a atenção adequada dos pais e da escola. Não quero dizer com isso que todas as crianças portadoras de TDAH sejam superdotadas, e nem que todas as crianças superdotadas apresentem características de TDAH, isso é apenas uma exemplificação.



É uma tarefa difícil orientar essas famílias?


Na realidade quando uma família nos procura ela já está cansada de sofrer. Sofrem porque não entendem o que está acontecendo, sofrem por não saberem como agir com seu filho, em fim, elas vem em busca de ajuda para poderem ser mais felizes. Quando descobrem que seu filho ou filha tem talento para alguma coisa e não tem habilidade para outras, no início se sentem frustradas, depois vão aceitando e começam a ver a vida de uma forma mais fácil e mais “normal”, a ansiedade e a angustia são mais controladas e a vida familiar passa a ter mais equilíbrio.



Que problemas que enfrentam dentro das instituições educacionais?



Muitas escolas não sabem como lidar com essas crianças e adolescentes e, como as famílias, discriminam essas crianças, às vezes cobram de mais, outras exigem bem menos. Essas crianças frequentemente enfrentam a inveja dos outros, são discriminadas e rejeitadas por seus pares.



Talentos excepcionais têm necessidades educativas especiais?



Se a Educação fosse realmente boa, se os professores melhores preparados e as escolas servissem para o que realmente escrevem como objetivos e missão da instituição, penso que não seria preciso uma ação educativa diferenciada, já que para mim todos os indivíduos são especiais e cada um tem um talento e uma habilidade específica.



Crianças com talentos excepcionais são marginalizadas? De que forma?



Às vezes sim, são marginalizadas por seus pares. Às vezes elas mesmas se isolam, ou por acharem as outras crianças de sua idade muito infantis, ou por não terem a habilidade do relacionamento próprio da idade cronológica.



A sociedade normalmente premia talentos excepcionais, em que medida isso é saudável?



Particularmente não sou favorável a este tipo de conduta já que penso que todos têm seu talento especial, todos são pessoas únicas. Enquanto a sociedade premiar talentos intelectuais e cognitivos não dará condições de outros talentos se desenvolverem. Não vejo como salutar este tipo de premiação, nem para o premiado e nem para a sociedade. Pergunto: o que este Ser fará com o prêmio? Para que serve isso?




No Brasil, existem escolas especiais, que tenham um ambiente estimulante, e que visem o desenvolvimento dessas crianças?



Existem muitas instituições que investem em ambientes mais estimulantes para todas as crianças. São instituições que investigam esse tipo de comportamento e desenvolvimento cognitivo.



Que mensagem deixa aos congressistas, participantes e a todos os psicopedagogos?



Olhem sempre todas as crianças como seres superdotados. Porém dirijam seu olhar psicopedagógico para todos nós que estamos em desenvolvimento social, intelectual, afetivo e espiritual e que precisamos de muito afeto, amor, atenção e respeito. Mesmo as crianças com um talento especial em um campo determinado não tem habilidade em outras áreas. Todos nós estamos no mundo para aprendermos a ser melhores e os chamados superdotados não estão fora desta etapa do desenvolvimento evolutivo. Eles estão no mundo para aprenderem a ser melhores do que são. Portanto não tenham medo de trabalhar com “gênios”, superdotados, talentosos, ou outro nome que queiram dar. Todos nós somos talentosos e se nos dedicarmos com amor, estudo, observação, carinho, humildade, coerência, espera, respeito e desapego, tenho a certeza que estaremos fazendo um excelente trabalho para o desenvolvimento da humanidade.



Maria Cecília Castro Gasparian - Mestre e Doutora em Educação: Currículo PUCSP. Pedagoga, Psicopedagoga Clínica e Institucional PUCSP, Terapeuta de Família, Membro da AMCE Associación Mundial da Ciências de la Educación, Pesquisadora do GEPI Grupo de Estudos e Pesquisa da Interdisciplinaridade da PUCSP

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